Espaço aberto para a diversidade
Fórum Hip Hop de Belo Horizonte e Região Metropolitana, instituído no fim do ano passado, busca legitimar e firmar espaço do movimento no cenário cultural da capital mineira e dos municípios vizinhos
Desde dezembro do ano passado, a capital mineira e municípios vizinhos – incluindo Betim – participam mensalmente de reuniões promovidas pelo Fórum Hip Hop de Belo Horizonte e Região Metropolitana, no Centro de Referência da Juventude, na praça da Estação, na região Central de BH. Os encontros entre representantes da classe artística ligada ao movimento acontecem sempre na primeira segunda-feira de cada mês e têm o propósito de contribuir para a elaboração de políticas públicas culturais reservadas para o hip hop na Grande BH.
Na prática, a missão do fórum – instituído por meio de uma portaria da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte, há pouco mais de três meses – é defender o pagamento de cachês a grupos locais (muitas vezes preteridos diante de artistas de fora), estabelecer a montagem de um palco específico para o movimento em eventos promovidos pelo Executivo e valorizar a produção regional, conforme explica um dos coordenadores da iniciativa, Júnio Marques, também conhecido como Rapper Blitz. “O fórum veio para garantir editais exclusivos, para não termos que bater de frente com a MPB, a arte cênica, a TV e outros movimentos. Ele busca um desenvolvimento consciente, de raiz e puro da cultura hip hop”, diz.
De acordo com a Prefeitura de Belo Horizonte, o fórum está previsto no regimento do Conselho Municipal de Política Cultural, que integra o Sistema Municipal de Cultura. Trata-se de “um colegiado consultivo que busca identificar as demandas e os interesses dos atores e coletivos de cultura urbana e levá-los ao poder público, garantindo, assim, o direito de serem ouvidos por um governo que os represente”.
Trajetória
A conquista desse reconhecimento teve início com um projeto idealizado pelo Rapper Blitz na comunidade do Taquaril, na região Leste de BH, onde ele vive. Há aproximadamente uma década, ele coordenava uma oficina de hip hop dentro do programa Fica Vivo!, da Secretaria de Estado de Defesa Social. Na época, os jovens de 14 a 24 anos eram atendidos em uma escola local, mas o espaço acabou ficando pequeno para as atividades. A solução veio em agosto último, quando a equipe de uma série de TV – “Canal Televisão: Um Morro do Barulho” – procurou Blitz para que ele fosse o produtor local e auxiliasse na locação de imóveis e no acesso a algumas casas para as gravações da série.
“Precisávamos de um ‘QG’ para a produção. Então, entrei em contato com a associação comunitária do bairro, que tinha um prédio desocupado, utilizado esporadicamente para assembleias, e conseguimos alugar o espaço, que foi usado ao longo de um mês, durante as gravações. Nesse período, comecei a ter uma visão do que poderia ser feito ali depois que acabasse a série. Voltei a conversar com a diretoria da associação, que achou interessante a ideia de trabalhar com jovens no prédio”, relembra Marques.
A princípio, a proposta era fundar um projeto de cinema, chamado “Cineclube Sabotage” – em homenagem ao rapper brasileiro de mesmo nome morto em 2003 –, mas o local acabou se tornando multicultural dentro da comunidade e foi batizado de Casa do Hip Hop Taquaril. A inauguração, em outubro de 2016, contou com grafiteiros convidados para dar uma nova cara à fachada do prédio, grupos de teatro, a juventude hip hop local, representantes do governo municipal, associações culturais e comunitárias.
A partir desse encontro, a ideia de criar um grupo que fortalecesse o movimento e conferisse mais legitimidade a ele na cidade e no entorno dela ganhou mais força, segundo Blitz. “Fizemos uma roda e elaboramos uma lista com os contatos de todo mundo para tentarmos conversar em outra oportunidade sobre a montagem dessa rede. E deu certo. De fato, conseguimos articular uma nova reunião”, explica.
Depois de uma visita do presidente da Fundação Municipal de Cultura, Leônidas Oliveira, à Casa do Hip Hop Taquaril, o recém-criado grupo apresentou a ele as demandas do movimento e conseguiu, além da criação do fórum, a realização da primeira Semana do Hip Hop de Belo Horizonte, em homenagem ao dia mundial do gênero musical (12 de novembro), que nunca havia sido comemorado na capital.
O auxiliar de almoxarifado Sandro Alves, de 21 anos, participa das oficinas de rap da Casa do Hip Hop Taquaril desde a inauguração do espaço e não consegue se imaginar longe do movimento. “O rap é o norteador de minha vida”, afirma.
A relação com o hip hop surgiu há quatro anos, durante um retiro espiritual. Na época, Alves já dançava break e acabou se aventurando também nas rimas. Um ano mais tarde, começou a fazer funk, até que conheceu o trabalho de Blitz na comunidade, e a “veia para o rap apareceu”, relembra. Hoje, ele respira o ritmo. “Vivo praticamente 24 horas por dia pensando em rap”, revela.
Perfil
Júnio Marques, de 37 anos, ganhou o apelido de Blitz porque era essa a palavra que ele pichava pela cidade na adolescência. Segundo ele, foi a criminalidade que acabou o aproximando do hip hop, como de praxe acontecia entre os jovens daquela época.
“Um dia, indo para minha boca de fumo, tinha dois meninos sentados na praça com camisas grafitadas, e eu escutei o som deles. Cheguei para conversar, achei a batida doida. No meio da conversa, me bateu uma inspiração, pedi um pedaço de papel e lápis e escrevi uma música. Eles falaram que eu cantava demais, e entrei para o grupo deles”, recorda-se.
Hip Hop
O hip hop é um gênero musical que surgiu na década de 1970, em comunidades jamaicanas, latinas e afro-americanas da cidade de Nova Iorque, nos Estados Unidos. O movimento, criado por Afrika Bambaataa, ganhou popularidade nos anos 1980, no país norte-americano, e nos anos 1990, nas outras partes do mundo. Quatro eixos formavam a base da cultura hip hop: rap, DJing, breakdance e grafite.