Iniciativa que transforma vidas

Conversa Refinada: Helder Dehon de Paula

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Criado em 15 de Julho de 2015 Conversa Refinada

Fotos: Bruno Salomão

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Caçula de uma humilde família composta por 13 irmãos, o empresário Helder Dehon de Paula, 55, aprendeu, ainda criança, o significado de sacrifício e de trabalho árduo. Vitorioso na vida profissional e pessoal, ele encontrou motivação suficiente para – além de administrar a Visual Construtora, empresa da qual é proprietário, e demais negócios – manter, sem auxílio governamental, a Casa Assistencial Vidas Restauradas, um lar de recuperação para dependentes químicos situado na histórica São João del Rei, região sudeste de Minas Gerais, onde ele vive com a esposa. Nesta Conversa Refinada, o gestor dá voz ao homem de fé inabalável, que nunca deixou de acreditar no poder de superação das pessoas.
 
Julia Ruiz
 
REVISTA MAIS - Quando surgiu a ideia de fundar um lar para receber e tratar dependentes químicos?
HELDER DEHON DE PAULA - Essa iniciativa já fazia parte dos meus sonhos há mais de dez anos.
 
Quando foi fundada a Casa Assistencial Vidas Restauradas (AAVR) e qual a estrutura do local?
A casa foi fundada em 19 de junho de 2012 e, desde então, funciona em uma chácara de minha propriedade, na rua Eugênio Coelho da Silva, nº 108, no bairro Vila Nossa Senhora de Fátima, em São João del Rei. As instalações são excelentes, acima dos padrões de muitas associações do ramo, com um espaço verde e amplo, de aproximadamente 4.000 m², pomar com grande variedade, sala de atendimento psicológico, campo de futebol, piscina, alojamento, salão de cultos e reuniões, cantina, lavanderia, dentre outras seções. Trabalham na casa quatro monitores, que chamo de obreiros, uma psicóloga, uma secretária e uma cozinheira.
 
De que forma se dá o amparo aos dependentes?
Em essência, nosso trabalho é auxiliar as pessoas com dependência química a recuperarem sua sobriedade, se libertarem das drogas, reconstruírem seu caráter e resgatarem o amor e a união de suas famílias. O primeiro passo para a internação é a visita a um médico psiquiatra particular, o que, muitas vezes, custeamos. Também, quando solicitado pelo paciente ou observada, pelos cuidadores, alguma necessidade especial, ele é encaminhado para cuidados médicos. Para isso, disponibilizamos um veículo 24 horas no local, sempre com acompanhamento de um colaborador da casa.
A ASVR utiliza métodos científicos, como o tratamento com remédios, que é prescrito por um especialista, juntamente com um acompanhamento psicológico. No entanto, entendemos que a dependência química vai além de uma doença somática do corpo e atinge também a alma, o espírito das pessoas. Sendo assim, utilizamos como base de nossos trabalhos a Bíblia e todos os ensinamentos que a mesma traz a respeito da libertação espiritual. Cremos que, somente dessa maneira, o ser humano poderá ser verdadeiramente livre das drogas.
Contamos, em nosso corpo técnico, com obreiros cristãos evangélicos, que, diariamente, passam esses fundamentos aos internos, e temos ainda um cronograma semanal de atividades esportivas e recreativas, como leitura, artesanato e oficinas lúdicas.
 
Desenvolver esse trabalho sem qualquer ajuda governamental deve trazer muitos desafios. O que o motivou?
Me motiva muito a crença de que todos nós temos muito para dar, independentemente de nossas limitações, sejam elas de idade, financeiras ou físicas. Entendo que, se tenho algum sucesso financeiro na vida, posso muito bem dividir isso com meu próximo. No caso específico da dependência química, vivenciei essa situação, tanto em minha família, quanto em meu grupo de amigos, e perdi várias pessoas queridas, o que acabou por despertar em mim esse desejo de ajudar outros dependentes químicos. Quanto aos desafios, realmente manter um lar como esse, embora seja muito gratificante, não é fácil. Além das dificuldades financeiras, existe toda uma burocracia com documentos, regras, leis trabalhistas, recaídas de internos... Às vezes, me pego pensando que, até para ajudar as pessoas neste país, é difícil. Mas, graças a Deus, meu lema fala mais alto: “Nos caminhos desta vida, às vezes posso sofrer, mas as dificuldades sempre vão me fazer crescer e reconhecer o poder de Deus”.
 
Quantos dependentes a AAVR já auxiliou? E quantos são mantidos atualmente?
Já tratamos cerca de 130 homens. Hoje, cuidamos de 11 internos, a maioria de famílias carentes, que não têm condições de pagar pelo tratamento. Então, arcamos com todos os custos.
 
Os tratamentos são gratuitos a todos?
Posso dizer que 90% dos tratamentos são gratuitos, que é o que conseguimos atualmente, mas nosso objetivo é fornecer o tratamento sem qualquer custo a 100% dos internos, desde que consigamos angariar mais recursos para esse fim.
 
Por que o senhor optou, inicialmente, por tratar apenas homens?
Porque estávamos começando, e nosso espaço físico não comportava os dois sexos. Além disso, percebemos que os homens são maioria no fator dependência química. Agora, entretanto, adquirimos uma propriedade ao lado da AAVR, já a reformamos e estamos nos preparando para tratar também mulheres. A expectativa é inaugurar o novo espaço em janeiro do ano que vem.
 
O senhor poderia dividir conosco algumas das histórias que mais o comoveram nesse tempo à frente da AAVR?
São muitas histórias emocionantes que vivemos nessa caminhada, e elas são como verdadeiras locomotivas que me impulsionam a querer fazer cada vez mais para recuperar vidas. Lembro-me de um fato que mexeu muito comigo e me fez chorar de emoção dentro de um supermercado. Eu estava na fila para pagar as compras quando o caixa se levantou e passou por todos, foi ao fim da fila, me deu um forte abraço e disse: “Hoje estou trabalhando aqui, sustentando minha família e sendo uma nova pessoa graças ao tempo em que fiquei internado na casa assistencial”. Meu sentimento não podia ser melhor.
Outra história bacana é a de um dos primeiros internos que abrigamos na casa. Quando ele chegou, estava magro, abatido, rejeitado pela própria família, totalmente entregue ao álcool e às drogas. Hoje, fico muito satisfeito quando o vejo dirigindo o carro da empresa em que trabalha, forte, bonito, feliz, com o apoio da família. Praticamente outra pessoa. Aí eu digo para mim mesmo que isso só pode ser obra de Deus.
 
O senhor nos contou que já empregou vários ex-dependentes, o que demonstra sua fé nas pessoas e no poder de superação delas. A que o senhor atribui esse sentimento?
Bem, eu, como fundador e mantenedor PAULAda casa, juntamente com toda a equipe que lá trabalha, não tenho dúvidas do método que usamos para recuperar a vida das pessoas que chegam lá. Além disso, creio plenamente que, da mesma forma que o sol nasce todos os dias, as pessoas podem e têm o direito de mudar. Eu não creio que “pau que nasce torto morre torto”. Tenho ex-dependentes comigo em postos de combustível, na construção civil, na metalurgia ou como motoristas. São pessoas que, assim como outras, tiveram sua chance e a abraçaram.
 
 
Como o senhor vê a dependência química? E o que é preciso fazer para superá-la?
A dependência química é o grande mau deste século. Ela tem destruído famílias; pessoas matam, roubam, adulteram, se prostituem, perdem sua própria identidade e cometem todo tipo de erro em função das drogas. É necessário um grande levante contra a dependência química, uma união entre o poder público, a iniciativa privada e toda a sociedade. Mas, enquanto isso não ocorre, cada um tem que fazer sua parte. Tenho convicção de que todo dependente sabe que sem a droga é melhor, mas não há força suficiente para deixar o vício. Então, ele precisa muito de nossa ajuda.
 
Como é a relação do senhor com os familiares dos internos?
Os familiares dos dependentes muitas vezes acabam ficando doentes também. Na casa, em dias de visita, os parentes têm a oportunidade de compartilhar suas experiências com outras famílias, em um grande lanche juntos. Essa interação é muito positiva, pois o apoio e o amor da família são fundamentais para o sucesso do tratamento. Acompanho todo o processo com essas famílias e, graças a Deus, vejo que muitas voltam a ser felizes sabendo onde os filhos estão, com quem estão e que estão progredindo. Os familiares, sempre que me veem, demonstram muita gratidão, e isso me deixa muito feliz.
 
Como o senhor se sente sabendo que salvou vidas? Qual a maior recompensa desse trabalho?
É uma felicidade imensa poder contribuir para a recuperação de pessoas. Vim de uma família pobre e tive que trabalhar desde muito cedo. O primeiro negócio que fiz foi comprar uma caixa para engraxar sapatos e, a partir daí, não parei mais de trabalhar. Aprendi a tratar o cliente que me compra 1 milhão de reais com o mesmo respeito que trato aquele que me compra uma caixa de mexerica em minha fazenda. Gente é gente, e o melhor negócio do mundo é salvar pessoas.
 
O que o senhor aconselharia a um adolescente que se encontra na mesma situação de dificuldade que o senhor já viveu?
Nada foi fácil em minha vida. A primeira empresa veio bem antes da Visual Construtora, em 1983. Já passei por diversos planos econômicos, dentre eles URV, Cruzado e Cruzado Novo, e períodos com inflação a mais de 50% ao mês. Sempre foi difícil, mas também sempre acreditei na força do trabalho, entendendo que oportunidades aparecem para todos nós, e o que faz a diferença são as nossas escolhas. Elas é que determinarão nosso futuro. Aos adolescentes, eu aconselho a não terem vergonha do trabalho. Todo trabalho honesto é abençoado por Deus. Aconselho, também, a não se conformarem com as situações adversas e a entenderem que tudo é possível para aquele que crê em Deus, no trabalho e na família.

 




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