Quando o sexo vira um tormento

Saiba mais sobre o vaginismo, disfunção sexual que impossibilita ou dificulta a penetração, afetando negativamente a vida sexual de muitas mulheres.

Criado em 09 de Fevereiro de 2017 Saúde e Vida
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 Mesmo no século XXI e diante da evolução do mundo em vários aspectos, alguns temas permanecem tabus ao longo dos tempos, como o sexo e tudo que o envolve. Falar sobre o assunto ainda é algo desconfortável para muita gente, e, para quem sofre de transtornos ou disfunções sexuais, pode ser ainda mais difícil. É o caso de milhares de mulheres vítimas do vaginismo, uma disfunção sexual que provoca a contração involuntária da musculatura pélvica durante a penetração, ocasionando dor ou forte ardência. Na maioria das vezes, essa parte do ato sexual se torna impossível ou é feita de modo parcial. Segundo relatos, o desconforto é tão grande que até exames ginecológicos essas mulheres têm dificuldade de fazer.

De acordo com especialistas em saúde da mulher, 20% da população feminina brasileira sofre alguma disfunção sexual – o vaginismo é apenas uma delas. Conforme a ginecologista especializada em reprodução humana e em sexologia Fabiene Bernardes Vale informa, pelo fato de o tema ser tabu, muitas mulheres chegam a sofrer anos com o transtorno sem conseguirem identificá-lo. “Mulheres com vaginismo têm muito desejo, conseguem atingir orgasmo clitoriano e ter satisfação sexual com o parceiro. Mas não dão conta da penetração”, explica a médica. Segundo ela, por essa razão, essas mulheres se sentem incompletas, o que pode levar a uma autocobrança excessiva e, como consequência, a transtornos emocionais como ansiedade, depressão e baixa autoestima.

Foi exatamente o que aconteceu com Luísa*. Aos 24 anos, logo após ter se casado, ela percebeu que a relação sexual seria difícil de ser levada adiante. “Assim que nós voltamos da lua de mel, eu estava frustrada, e, então, meu marido fez um acordo comigo: não insistiria na penetração, já que poderíamos ter relação sexual sem isso. Achei meio estranho, mas aceitei, pois, para mim, era realmente muito desgastante, afinal, depois de toda tentativa, eu ia dormir chorando e me sentindo inferior”, recorda-se. Luiza passou por vários médicos, que apenas recomendavam a ela “tomar vinho e relaxar”. “Cheguei a fazer uso de Diazepan para tentar me acalmar, mas não resolveu”, relata.

 

 

 

Tratamento

O tratamento para o vaginismo é feito de várias formas. Uma delas, de acordo com a médica, é a terapia sexual. “É a dessensibilização sistemática, em que a gente faz um treinamento com a paciente para ela conseguir mandar um impulso certo para a vagina”, explica. Outra maneira é por meio da fisioterapia pélvica. De acordo com a fisioterapeuta especialista em saúde da mulher Rafaela Arrais Albuquerque, a fisioterapia desempenha um papel importante na reabilitação da função da musculatura do assoalho pélvico.  Resumidamente, é feito um trabalho de consciência corporal, sobretudo da região da pelve e do assoalho pélvico, para que a mulher conheça sua anatomia a fim de exercer o controle sobre o corpo. “Além disso, utilizamos recursos próprios da fisioterapia para auxiliar no retorno da função muscular, através de alongamentos, relaxamentos, massagem perineal, cinesioterapia, uso de dilatadores, exercícios respiratórios e de mobilidade da pelve, radiofrequência, eletroestimulação, entre outros”, detalha.

Segundo Arrais, o tratamento fisioterápico é focado nos músculos do assoalho pélvico, com o objetivo de reabilitá-los em todas as suas deficiências – controle, coordenação, força, tônus e resistência. Mas ela acrescenta: “a fisioterapia sozinha não resolve tudo. Além da dedicação de cada paciente em assumir sua responsabilidade no processo de cura, é importante o acompanhamento de um psicólogo ou de um sexólogo para tratar as questões emocionais”, salienta. De acordo com as especialistas, as chances de cura são grandes, e, em muitos casos, ela vem logo após o início do tratamento.

 Há solução

Mais do que saber reconhecer o problema e seguir o tratamento, o ideal é a mulher ter calma e não se considerar inferior, nem deixar a frustração tomar conta da mente. Foi o que Luísa fez, e, atualmente, dois anos após o início do tratamento, ela acredita ter avançado. “Hoje já realizo exames ginecológicos. Mas a penetração é algo que eu ainda não consigo permitir. Mas sei que em breve vou estar completamente curada porque essa é apenas uma parte da relação”, comemora.

A professora Valdinéa Felix, de 33 anos, obteve o diagnóstico em 2015 e percorreu um longo caminho até descobrir a disfunção. Ela conta que, desde a primeira relação, sentia fortes dores, um verdadeiro “tormento”, como ela mesma define. Nos namoros seguintes, ela começou a desconfiar de que a situação não era normal e, ao pesquisar na internet, leu sobre o vaginismo. Mas seus médicos diziam apenas que ela precisava relaxar.  Somente após o quinto relacionamento e várias consultas com médicos diferentes, ela foi devidamente diagnosticada. “Hoje, eu faço fisioterapia e terapia com sexóloga. Estou progredindo aos poucos. É preciso ter paciência e perseverança”, resume.

O mesmo aconteceu com a veterinária Sofia Khouri, de 32 anos, que encontrou na internet e em grupos nas redes sociais apoio para enfrentar a disfunção. Ela realizou tratamentos holísticos, leu livros sobre o tema e se tratou em casa com o uso dos dilatadores. Aos 30 anos, ela tinha vergonha de dizer que ainda era virgem, mas contou com o apoio e a compreensão do atual namorado. Há cerca de um ano e meio, ela conseguiu ter a primeira relação sexual sem dor. “Depois de dois meses de tratamento, com muita disciplina, consegui fazer sexo e me emocionei muito, pois antes me sentia menos mulher”, confessa. “Busque o autoconhecimento acima de tudo, mas saiba que o vaginismo tem cura! Tome uma atitude a seu favor, ame-se acima de tudo e não desista”, aconselha.

 Procurando ajuda

A ginecologista Fabiene Bernardes destaca que sentir dor durante o ato sexual não é normal. Ela recomenda às mulheres que, caso a dor apareça e seja constante, procurem um médico. “A mulher com vaginismo deve buscar ajuda, pois um dia ela vai precisar fazer exame ginecológico ou querer engravidar”, completa.

A fisioterapeuta Rafaela Arrais salienta que todas as mulheres merecem ter uma função sexual saudável e prazerosa e ainda dá uma dica. “Você quer um exercício? Vá para a frente do espelho, coloque as mãos no quadril e imagine que está rodando um bambolê. Isso mesmo: feche os olhos e sinta seu corpo, sinta sua respiração. Você é capaz!”, arremata.




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