As vozes de Betim
Música
Fotos: Divulgação/ Hilário José
Pouco mais de um mês após vencerem a terceira edição do “The Voice Brasil”, Danilo Reis e Rafael ainda colhem os frutos do trabalho; além da disparada no valor do cachê e do aumento considerável do número de fãs, eles se preparam para participar de uma turnê nos Estados Unidos e lançar, até março deste ano, o segundo CD da dupla
Lisley Alvarenga
QUANDO SUBIU NO PALCO DO “The Voice Brasil” pela primeira vez, no dia 25 de setembro de 2014, a dupla Danilo Reis e Rafael deu o maior e mais importante passo de suas vidas. Vencedores da terceira edição do famoso reality show, os meninos de Betim deixaram de ser mais um entre os milhares de artistas em todo o país que lutam, na maioria das vezes, anos a fio, para conseguir um pequeno espaço ao sol, para alçar voos bem mais altos. Hoje, pouco mais de um mês após o fim do programa, o cachê da dupla, que girava em torno de R$ 300, é uma página virada; eles seguem uma agenda de shows lotada, que terá, inclusive, uma rápida turnê na terra do tio Sam, e se preparam para lançar, em meados de março deste ano, o segundo disco da carreira, sob a batuta de ninguém menos que a gravadora Universal Music Brasil. No repertório, músicas autorais e canções apresentadas ao longo do programa, incluindo “Sinônimo”, de Zé Ramalho, marco da história deles no reality. “Tudo na nossa vida mudou depois do ‘The Voice Brasil’. Antes, nós tocávamos apenas em barzinhos e casas de shows de Betim, como o Bar do Dirceu, o Dona Rosa, o Café com Arte, o Arrasta-Pé e o Caipirão. Agora, adquirimos outro patamar, nos apresentando em casas de shows e em eventos em todo o país e até no exterior”, conta Rafael, 24.
Ou seja, tudo mudou para bem melhor. A começar pelo prêmio ganho pela dupla no reality, de R$ 500 mil. Danilo, 23, disse que preferia não comentar a forma como havia gastado o dinheiro; já Rafael, mais comedido, confessa que tem dúvidas sobre o que fazer com o prêmio. “Estou deixando render os juros no banco. Não sou pão-duro; é porque penso muito antes de fazer as coisas, antes de tomar qualquer atitude. Mas minha ideia inicial é investir em imóveis, já que não sei o que vai acontecer com a gente daqui pra frente. Da mesma forma que hoje nós estamos no auge, amanhã pode acontecer alguma coisa e mudar tudo isso”, pondera.
Os sentimentos de insegurança e apreensão descritos acima por Rafael são bastante compreensíveis. No Brasil, é comum ver artistas que explodiram na mídia, sejam eles consagrados ou iniciantes, caírem no esquecimento do público. Contudo, essa triste realidade, se depender da dedicação e da garra desses garotos, não vai ocorrer com eles. “Se você não está apresentando um trabalho bom, não merece estar no mercado. Tem muita gente boa por aí, e, se você não se dedicar, elas tomam o seu espaço. Por isso, estamos nos empenhando ao máximo, trabalhando e ensaiando muito para melhorar cada vez mais. Também vamos priorizar a nossa voz, com a ajuda de especialistas”, revela Danilo.
E não há dúvidas de que eles são excelentes cantores. Tanto que a voz de Rafael foi muito elogiada por Lulu Santos na noite em que a dupla se apresentou no reality e decidiu entrar para o time do Daniel. “Barítono, como eu também sou”, disse Lulu, na época, encantado. A expressão, usada pelo jurado do “The Voice”, refere-se a uma voz mais grave, que chega a ser mais aveludada que a dos tenores. Rafael se lembrou desse momento mágico do programa quando perguntado sobre qual avaliação ele faz da voz da dupla. “Quando a gente recebia os elogios do Lulu e dos demais jurados, ficava sem entender. Nunca fiz aula de canto, sou autodidata. Também sou um artista tímido, mais acanhado. Mas, Graças a Deus, essa timidez não é prejudicial para minha carreira. Quando tenho que subir no palco, fazer um show, eu dou o meu melhor. Inclusive, ouvi muita gente dizer que esse meu jeito é o que cativou as pessoas”, constata Rafael.
E Danilo não fica pra trás. Como seu jeito mais extrovertido e dono de uma voz suave e marcante, ele faz muito bem o seu papel de segunda voz. Também autodidata, ele não se cansa de buscar a perfeição como profissional. “Sou muito esforçado e determinado a estar sempre melhor. Sei que preciso evoluir muito, mas tanto eu quanto o Rafa nos esforçamos muito para isso. A gente se dedica bastante e tenta, sem cessar, atentar para os mínimos detalhes para fazer um show bom e com músicas agradáveis de se ouvir”, salienta.
Os elogios de Lulu Santos à dupla não pararam por aí. Logo após ser anunciada a vitória deles, no último episódio do programa, no dia 25 de dezembro, o músico disse, em um comunicado divulgado pela Rede Globo, que Danilo Reis e Rafael têm um traço na personalidade deles, a simplicidade. “Ela é a tradução da verdadeira sofisticação dos dois. Eles têm a capacidade de juntar a zona norte com a zona sul. Sabem administrar toda a grandeza da música brasileira”, declarou Lulu na ocasião. E o cantor não exagerou nas palavras. Com esse jeitinho de meninos “do interior”, Danilo Reis e Rafael mostraram para todo o Brasil que são capazes de se sair bem cantando desde o sertanejo universitário até o pop rock, passando ainda pelo sertanejo clássico e pela MPB. Prova disso está na votação que atribuiu a vitória à dupla, que obteve 43% dos votos do público.
BASTIDORES DO PROGRAMA
A admiração deles por Lulu é recíproca, apesar de, nos bastidores do reality show, eles terem convivido pouco com o cantor. “Tanto pra gente quanto para os técnicos, a rotina é muito corrida. No nosso caso, víamos muito pouco o Lulu e batíamos papo com ele de vez em quando. Ele nos dava alguns toques e ia nos corrigindo até chegarmos ao ponto exato”, recorda Danilo. “Um dia antes da gravação do programa, a gente tinha um ensaio com o Lulu. Lá que nós acertávamos os últimos detalhes da apresentação. Nossos ensaios aconteciam, na maior parte do tempo, em casa. Somente na quarta-feira, um dia antes da gravação do programa, a gente ía para o Rio de Janeiro e repassava para ele tudo o que havíamos feito em casa. O que achava de bom e de ruim ele falava, até o momento de chegarmos a um comum acordo. Apesar do pouco convívio, percebemos que ele é uma pessoa sensacional”, completa Rafael, que confessa ter acreditado, no início, que Lulu fosse uma pessoa mais fechada, impressão que, segundo ele, logo caiu por terra. “Ele tem aquele jeitão de artista. Por isso, no começo, a gente achou que ele era uma pessoa brava. Mas, ao contrário, é supertranquilo. E o melhor de tudo é que ele se identificou bastante com a dupla. Sempre que ele nos via, nos dava um abraço. Teve um dia antes do programa que eu estava passando mal, e ele veio me perguntar se eu estava bem. Foi super atencioso com a gente desde o início do programa. Temos muito gratidão por ele, é uma pessoa que não vai sair mais de nossas vidas, da nossa história”, afirma Rafael ao confessar que, recentemente, emocionou-se ao ouvir, em casa, uma das composições de Lulu. “Estava escutando a música ‘Apenas mais uma de amor’ e, como já sou uma pessoa muito emotiva e sentimental, comecei a chorar de novo. Lembrei-me de tudo o que aconteceu com a gente e me emocionei. Foi uma sensação única”, relata.
VIDA PÓS-REALITY
Já Rafael, mais caseiro, prefere abrir mão das “saídas” para curtir seus momentos de descanso em casa. “Depois do The Voice , a gente ainda não teve tempo para parar e respirar direito, mas, quando tivemos esse pequeno período de sossego, Danilo quis ir para o Rio de Janeiro, curtir a cidade, e eu acabei ficando em casa, com meus pais”, conta. “Como também sou apaixonado por futebol, sempre que posso, vou ao Mineirão ver os jogos do Cruzeiro. Além disso, sou viciado em videogame, assim com o Danilo”, completa.
ASSÉDIO DAS FÃS
Como se não bastasse o aumento do número de shows e do próprio cachê, a lista de fãs da dupla também cresce de forma considerável. No auge do programa, eles chegaram a receber 2.000 mensagens por dia. No caso de Rafael, algumas chegavam a ser bem picantes. “A gente acordava de manhã, pegava o celular e se deparava com essa quantidade de mensagens. Era uma loucura. Muita gente não entende, mas, por causa desse assédio, tivemos que trocar de número. Você não consegue responder a todos, e as pessoas ficam chateadas com isso. Acham que não estamos dando a atenção devida, mas não é isso. É impossível responder a 2.000 mensagens por dia. Se a gente fizesse isso, não teria tempo pra ensaiar, ir para o estúdio e gravar nosso segundo CD”, justifica.
Com Danilo não foi diferente. Ele conta que, durante o período em que o programa esteve no ar, chegou a receber propostas indecentes. “Em respeito às nossas fãs, decidimos não responder a esse tipo de mensagem para não magoar nem criar expectativas em ninguém”, explica.
E, para a alegria das fãs apaixonadas pela dupla, tanto Rafael quanto Danilo estão livres e desimpedidos. Pelo menos é isso que a dupla afirmou à reportagem. “Com essa rotina corrida, a gente não tem tempo para conhecer uma pessoa”, garante Danilo. Mas nada que o impeça de sonhar encontrar alguém especial. “Estou muito a fim de arrumar uma namorada. Gosto de ter uma pessoa ao meu lado. Temos que valorizar muito a pessoa que estará nos apoiando, nos compreendendo. É muito difícil achar alguém com cabeça boa, que vai entender esse momento de nossas vidas, mas o interessante seria, sim, ter uma pessoa para nos apoiar e, quando tivermos um tempo, poder ficar com ela”, desabafa Danilo.
Adepto da lei do “solteiro sim, sozinho nunca”, Rafael confessa que, apesar de estar solteiro há apenas três meses, sempre fica com alguém, nada muito sério. “Como sou muito caseiro, e o Danilo gosta mais de sair, é mais fácil para ele se acostumar a não namorar. Em balada, você encontra muita menina bonita. Como sou mais quieto, é como se eu tivesse uma necessidade maior de ter uma pessoa ao meu lado. Mas, neste momento, confesso que prefiro ficar solteiro e focar o meu trabalho”, diz o cantor, para a tristeza das fãs.
O ENCONTRO DOS TALENTOS
Verdadeiros talentos do cenário musical atual no Brasil, Danilo Reis e Rafael são um orgulho para Betim. Rafael, apesar de ter nascido em Belo Horizonte, mudou-se para cá com apenas 2 anos. Foi aqui que ele passou grande parte da adolescência, estudou o ensino fundamental e os primeiros anos do ensino médio, sempre em escolas públicas. “Com 16 anos, fui para Nova Lima e me formei lá, pois, na época, eu já jogava futebol”, recorda. Rafael atuava como goleiro pelo time profissional de Nova Lima, mas, antes disso, percorreu dezenas de times amadores de Betim, como Portuguesa, Industrial, Vera Cruz, Sete de Setembro e Rubro Negro. A paixão pelo esporte era tão forte que ele até apitou jogos de futebol realizados em escolas do município. Aos 20 anos, desistiu do sonho de ser jogador de futebol e resolver investir nos estudos. “Percebi que minha vida como jogador não teria futuro. Mesmo após quatro anos, eu não tinha retorno financeiro. Decidi, então, largar o futebol para estudar, me dedicar à faculdade”, conta.
Quando criança, Rafael sonhava em ser jogador de futebol, jornalista esportivo ou cantor, mas, por causa da timidez, a vida de artista ficou em terceiro plano. “Até para cantar em festas de família era uma dificuldade. Ainda sou muito tímido, mas melhorei muito. Fui obrigado a melhorar, pois, se não me libertasse dessa timidez, não conseguiria cantar em público”.
Muitas vezes, a paixão musical começa com o desejo de aprender a tocar algum instrumento. Foi assim com Danilo, ou Juninho, para os íntimos. Desde cedo, ele desenvolveu o amor pela música. Muito religioso e católico praticante, ele, desde novo, sonhava ter uma banda. A primeira da qual fez parte, uma gospel, também ensaiava músicas para bailes. “Tocávamos todos os ritmos, desde forró a pop rock, mas não chegamos a nos lançar profissionalmente. Depois, larguei a banda para fazer um curso de técnico em segurança do trabalho. Quando fui amadurecendo, na adolescência, passei a curtir mais sertanejo; nessa época, o ritmo bombava em Minas, com Jorge e Mateus e Victor e Léo”, recorda.
E foi nessa mesma época que os amigos, já adultos, se reencontraram, após sete anos sem se verem. “Estava trabalhando como entregador em um supermercado quando reencontrei o Rafael. Como eu já trabalhava com música, tivemos a ideia de começar a tocar. Pegamos o violão e começamos a fazer umas modinhas, sem muita pretensão”, brinca Danilo. O sucesso foi tanto que, pouco tempo depois, a brincadeira se tornou algo sério. “O pessoal que nos via nas apresentações sempre gostava e falava pra gente acreditar no nosso potencial e investir. Quando fizemos nosso primeiro show em um barzinho, o Boiadeiros, no bairro Brasileia, a galera gostou bastante, e a casa ficou lotada. Nos empolgamos e decidimos correr atrás”, completa Rafael.
E apoiadores, durante esse árduo caminho antes da fama, não faltaram. Além dos pais e dos avós, que, segundo eles, foram e sempre serão seus maiores investidores e incentivadores, Danilo e Rafael contaram com o “empurrãozinho” de outros verdadeiros anjos, pelos quais a dupla tem extrema gratidão. Um deles é a prima de Danilo, Jéssica Pires Costa, 18. Foi por causa da insistência dela que Danilo e Rafael gravaram um vídeo e enviaram para a seleção regional do “The Voice”. “Se não fosse por causa dela, nós nunca teríamos participado do programa”, confessa Danilo. E ver sua dupla preferida brilhando em todo o país é gratificante para Jéssica. “Mesmo antes da fama, minha família sempre fez tudo por eles. A gente ia aos shows, fazia camisas, montou até um fã-clube. Quando eles foram selecionados para o reality, foi maravilhoso. Movemos montanhas para que eles ganhassem. Até panfletar a gente panfletou”, diz a vendedora.
Na história da carreira dos sertanejos, outro nome, Sidnei Silva, também tem um lugar muito especial. “Ele era meu professor e técnico na época em que eu estudava na escola JK, no Bueno Franco. Na primeira vez que ele nos viu tocando, em um evento no parque de exposições da cidade, ele disse que queria nos ajudar. Desde então, passou a investir tudo que podia na dupla”, revela Rafael. “Uma vez, a gente precisou ir para São Paulo para gravar uma entrevista, mas não tinha dinheiro. Foi ele quem comprou as passagens pra gente, e o que mais nos emociona é que ele fazia isso sem pedir nada em troca. O Sidnei foi como um pai para nós, assim como os nossos pais e avós, que, mesmo passando por dificuldades financeiras, sempre acreditaram em nós, seguraram as pontas e confiaram no nosso sonho, junto com a gente”, encerra Danilo, emocionado.