Cardápio Ambulante
FOOD TRUCKS
Luciano Nery largou o cargo de gestor comercial em uma multinacional para trabalhar com gastronomia; hoje, ele é dono da Crepioca e roda BH a bordo de uma picape Chevrolet S-10 adaptada/ Fotos: Hilário José
Food trucks, veículos gastronômicos que comercializam refeições em plena via pública, são a onda do momento na capital mineira
Paulo Galvão
O HÁBITO DE VENDER COMIDA NAS VIAS PÚBLICAS se popularizou a partir da segunda metade do século 19, mas ganhou uma cara nova neste início do século 21. Com o advento dos food trucks, como são chamadas as caminhonetes gastronômicas inspiradas nos famosos veículos do estilo em metrópoles como Nova York, a qualidade vem em primeiro lugar. Em vez daqueles trailers com chapa engordurada, ingredientes sem procedência e aparência duvidosas, que resultavam em insossos cachorros-quentes ou sanduíches pouco saudáveis, a onda agora é valorizar o preparo e o resultado final, em um ambiente agradável e ao lado de pessoas descoladas. Tudo sem perder a praticidade.
Não são poucos os empreendedores que viram nos simpáticos carrinhos uma excelente oportunidade de negócio. Muitos queriam montar restaurantes ou lanchonetes, mas, por falta de capital ou mesmo de pessoas necessárias para fazer um comércio como esse funcionar, foram literalmente para as ruas em busca da realização do sonho. É o caso de Luciano Nery, que largou o cargo de gestor comercial em uma multinacional para trabalhar com gastronomia. Dono da Crepioca (crepe com tapioca), ele roda Belo Horizonte a bordo de uma picape Chevrolet S-10 adaptada, passando a cada dia por um ponto para atender a uma clientela cada vez mais cativa. “Queria investir em um restaurante, mas vi que seria inviável financeiramente. Assim, depois de uma viagem à Europa, decidi pela comida de rua. Nosso custo é 50% menor que o de um ponto físico”, diz ele, que vende tapiocas entre R$ 5 e R$ 13 e crepes entre R$ 9 e R$ 17.
Além de garantir o fornecimento de alimento a preços acessíveis, ele tem muito cuidado com os ingredientes. O queijo Canastra, por exemplo, é feito na fazenda de um amigo. Já a carne seca é produzida pelo próprio comerciante. “Temos muito cuidado com o preparo dos alimentos”, afirma Luciano, que investiu R$ 100 mil na montagem do negócio, no qual trabalha com a mãe, Anatália, que é nutricionista, e com a esposa, Débora, que cuida das finanças e do relacionamento com os clientes, além de auxiliar dentro do carro.
A busca por um produto com sabor único no mercado, bem-preparado e, ao mesmo tempo, com preço acessível também foi o que motivou as irmãs Mônica e Fernanda Galan a montarem seu food truck, no caso, uma food Kombi. Com capital inicial de R$ 150 mil, elas colocaram a mão na massa para preparar deliciosas guloseimas, que são vendidas no “Cadê meu brigadeiro?”, a versão móvel de uma confeitaria, que, em uma mesma semana, pode ser vista na Vila da Serra, em Nova Lima ou no bairro Castelo, na região Norte de Belo Horizonte. Em alguns dias, elas chegam a percorrer três bairros da região metropolitana da capital mineira.
“Depois de descobrirmos o brigadeiro gourmet, nossa ideia inicial era a de termos uma loja, mas seria caro. Colocamos o produto em alguns restaurantes e, como a saída foi boa, começamos a buscar formas de expansão. Depois de muita pesquisa, investimos no food truck, mas não um qualquer. Temos aqui um conjunto de elementos, os produtos, a embalagem, a decoração, o atendimento, a música; tudo é pensado para propiciar uma experiência única aos nossos clientes”, explica Fernanda, cuja entrevista foi interrompida várias vezes para atender a clientela em busca dos doces preparados com esmero, com preços variando entre R$ 2 (a unidade) e R$ 80 (a caixa).
As irmãs comemoram o sucesso da empreitada preparando uma segunda Kombi para colocar nas ruas. A fim de dar conta da demanda, contam com três funcionários. “Antes de abrirmos, a Mônica fez um curso com um chef belga em São Paulo e desenvolveu a receita própria. Hoje, atendemos a eventos, festas, o que for necessário”.
CAMINHO INVERSO
Se montar ponto fixo era a ideia de muitos donos de food trucks inicialmente, há quem tenha trilhado o caminho contrário. Inquieto por natureza, Rodiney Ribeiro, mais conhecido como Lobão, decidiu que seu Vintage 13, um misto de bar e loja de roupas e acessórios localizado no coração da Savassi, não poderia ficar estático. Por isso, investiu R$ 23 mil na construção de um trailer para levar a todos os lugares a cultura kustom (surgida na década de 50, ela tem como pilar a arte da customização) e os pratos baseados em salsichões alemães, além de bebidas. “Quando resolvi montar o trailer, nem estava antenado para essa cultura de food truck. Queria apenas levar o Vintage 13 a outros locais, como encontros de motociclistas, festas eventos diversos. Felizmente, uma coisa se juntou à outra e tem tudo para dar certo”, explica o empresário, que já finaliza sua “obra” e pretende levá-la para as ruas em fevereiro.
Além de comida, ele usa parte do veículo para vender camisetas, bonés e outros itens da loja física. A cerveja, carro-chefe do estabelecimento, porém, ainda não faz parte do cardápio ambulante. “Estamos aguardando a legislação específica ser implantada, pois a atual proíbe a venda de bebidas alcoólicas nos food trucks. Enquanto isso, vamos participando de eventos privados e fazendo propaganda do Vintage 13, o que também é um ótimo negócio”, afirma.
NEGÓCIO PROMISSOR
A onda dos food trucks chegou com tanta força ao Brasil que começaram a pipocar por Belo Horizonte eventos reunindo os empreendedores. Quase todo fim de semana, estacionamentos e áreas abertas viram points dos vendedores de produtos gourmet, atraindo multidões ávidas por comer e beber bem. Um dos mais populares é o Gastro Park. O evento ocorreu pela primeira vez em dezembro, em um estacionamento na Savassi, e já vai para a sua terceira edição, com expectativa de crescimento de público.
“Na primeira edição, tivemos 1.200 pessoas. Na segunda (no São Pedro), foram 2.200. Para o terceiro, esperamos mais de 3.000. O resultado, sem dúvida, foi acima da nossa expectativa”, declara Marcelo Moreira, um dos organizadores do Gastro Park, cujo objetivo é aprimorar a estrutura a cada evento.
Os encontros são uma oportunidade de os donos dos food trucks estarem em contato uns com os outros e divulgarem a cultura da comida de rua de qualidade. A iniciativa deu tão certo que, em São Paulo, uma construtora montou um espaço específico para os comerciantes estacionarem. Tudo para chamar a atenção para um grande lançamento imobiliário na região Oeste da cidade.
Para participar do Gastro Park, os interessados devem se inscrever enviando mensagem para conta[email protected]. As vagas são limitadas, mas a procura tem sido tão grande que os organizadores estão buscando espaços maiores. Na última edição, participaram quatro carros e sete barracas. A entrada no evento é gratuita para o público, o que ajuda a garantir o sucesso da empreitada.