Consumo, uma faca de dois gumes
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Criado em 14 de Novembro de 2012
Comportamento
POR Lucas Fortunato Carneiro*
A cultura neoliberal cria, hoje, um efeito que tira o sono dos filósofos mais engajados: o ser humano assume o papel de objeto-mercadoria, e o objeto-mercadoria passa a ser o protagonista existencial.
A necessidade não mais dita a velocidade do consumo. O status que o consumidor quer alcançar frente à sociedade é que determina o consumo. Isso mesmo, o objeto-mercadoria é quem dita as regras, a marca, a grife, o status. Tudo isso aumenta a valorização e a imagem da pessoa.
Para que alguém seja aceito no grupo com que convive, ele precisa estar em uso dos objetos que todos utilizam, sejam eles necessários ou não. O efeito contrário, no caso de não haver a utilização de tais objetos, é a exclusão, o isolamento, a discriminação. Essas reações são comuns e podem ter consequências gravíssimas para a boa convivência e até mesmo para o desenvolvimento do ser humano.
O nível de consumo é que determina a aceitação ou não por determinado grupo. Portanto, o individuo passa a ser identificado como objeto: primeiro, por se subjugar à mercadoria; segundo, por ser rejeitado pelos iguais.
No universo consumista, só tem aceitação quem consegue transitar com a consciência tranquila entre as mais variadas imagens que são apresentadas. A produção acontece não para suprir uma necessidade, mas para acalentar um sonho, um desejo, um anseio de crescimento social. O humano não tem valor em seu local existencial, mas, sim, em seu potencial de compra.
A brutalidade consumista provoca a obsolescência do humano. Assim como os objetos se tornam ultrapassados em seu uso ou tecnologia, a pessoa se torna obsoleta. Daí, a única forma de inserção em um grupo, ou, como dizem, “tribo”, é colocando a armadura de objetos utilizados por todos. Isso faz com que aconteça a remissão do pequeno universo do comum dos mortais.
A divinização do consumo e dos objetos é fato que ocorre nos tempos modernos, e a grande propulsora é a mídia, que não faz distinção de classe. Tanto o pobre miserável quanto o milionário sofrem com o bombardeio midiático do consumo.
As ideologias consumistas que impregnam o ser humano de propagandas e imagens usam de todos os meios para que ele não se conheça por inteiro, pois, não se conhecendo, não irá raciocinar. Osho, que, originalmente, é um título de reverência concedido a certos mestres na tradição zen do budismo, orienta: "Você vive sem se conhecer porque a sociedade não quer que você se conheça. Isso é perigoso. Uma pessoa que conhece a si mesma fatalmente será rebelde".
''As ideologias consumistas que impregnam o ser humano de propagandas e imagens usam de todos os meios para que ele não se conheça por inteiro, pois, não se conhecendo, não irá raciocinar''
Portanto, desejamos sempre libertar tudo e todos, porém, para que isso aconteça, temos que parar de oprimir, escravizar e dominar a nós mesmos por meio da satisfação enlouquecida do nosso ego. Assim ensina Osho: "O ego lhe dá imagens falsas de si mesmo. Se você carregar por muito tempo essas imagens, ficará com medo. O medo acontece porque, se sua imagem cair por terra, sua identidade será despedaçada. Quem você será? Você enlouquecerá, pois investiu muito nela. E todos pensam sobre si mesmos em termos muito grandiosos, em muito falsos. Ninguém concorda com você, ninguém o aprova, mas seu ego acha que todos estão errados. Se você deseja se conhecer, precisa abandonar suas falsas autoimagens. E aí está o problema, pois isso não é muito bonito. Você se considera uma pessoa repleta de amor, mas existem também ciúme, possessividade, ódio, raiva e todos os tipos de negatividade. Para conhecer a si mesmo, é preciso se deparar com fenômenos feios. Eles estão ali, e cada um de nós deve atravessá-los. Você tem um belo ser dentro de você, mas ele não está na periferia,
está no centro”.
*Educador, graduado em filosofia pela PUC-Minas, graduando em teologia e Pós-graduando em psicopedagogia pela Fumec - [email protected]