Dengue pode estar com os dias contados

Capa | Solução para a dengue

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Criado em 22 de Junho de 2015 Capa

Fotos: Samuel Gê

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Dispositivo criado por pesquisadores da UFMG pode transformar o cenário atual do sistema de saúde do Brasil imposto pelo mosquito Aedes aegypti – o produto, que aguarda aprovação da Anvisa, é capaz de combater as larvas do inseto transmissor da doença; em outra vertente, grupo de estudiosos busca na Antártica fungos com capacidade de produzir substâncias que podem compor remédios para controlar e tratar doenças como a dengue
 
Daniele Marzano
 
Parece recente, mas a verdade é que, desde 1986, a dengue, doença viral transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, ocorre continuamente no Brasil, tendo sido o ano de 2013 o mais crítico, com o registro de cerca de 2 milhões de notificações, segundo o Sistema Único de Saúde (SUS). Somente no Estado de Minas Gerais, nesse mesmo ano, foram 368.387 casos confirmados, como mostra o Informe Epidemiológico da Dengue divulgado pela Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais (SES-MG) em 29 de maio último.
 
Para se ter uma ideia do tamanho do estrago que o vírus provocou na época, o mesmo informe da SES-MG revela 45.406 ocorrências neste ano, ou seja, de lá para cá, houve uma redução drástica do número de vítimas. Contudo, como os surtos são cíclicos, acontecendo a cada 3 ou 5 anos, pode-se afirmar que a situação ainda é delicada – 24 pessoas morreram no Estado em decorrência desse problema
somente neste ano de 2015 –, sendo necessárias, portanto, ações permanentes de prevenção, por parte da população, e estudos contínuos de pesquisadores em busca do combate à doença. Infelizmente, a primeira “lição de casa”, que é dos cidadãos, não tem sido feita de acordo com o esperado. É o que atestam pesquisas recentes, segundo as quais, mais de 80% dos focos de Aedes aegypti encontram-se dentro dos domicílios.
 
Mas a tarefa que cabe aos pesquisadores de Minas Gerais está sendo bem-conduzida. Pelo menos é o que os cientistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) estão provando por meio de experiências desenvolvidas vêm demostrando resultados interessantes e que apontam para alternativas de solução desse grave problema de saúde que afeta o país
há quase três décadas e que já vitimou, somente nos últimos seis anos, cerca de mil brasileiros, de acordo com o SUS.
 
Um dos grupos de pesquisadores da universidade federal é coordenado pelo doutor em química e professor do Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas (ICEx) da UFMG Jadson Belchior, que resolveu estudar o processo de proliferação do Aedes aegyti para tentar chegar a um ponto que evidenciasse o caminho do combate às larvas, já que exterminar os mosquitos é muito mais difícil. Assim, verificando que, depois da ovulação, os ovos eclodem e formam larvas e que essas, após se desenvolverem em pupas, transformam-se rapidamente no mosquito – gastando somente de 6 a 12 horas –, o estudioso conseguiu desenvolver um dispositivo que impede a eclosão dos ovos. “Nossa intenção era trabalhar um processo ambientalmente correto e que contribuísse com os métodos e
as tecnologias já disponíveis para evitar a proliferação da dengue”, afirma Belchior.
 
Segundo ele, esse produto criado, uma espécie de tijolo, ao entrar em contato com a água e a radiação solar, impede a eclosão dos ovos do mosquito Aedes aegypti enfraquecendo as larvas recém- -nascidas até matá-las. De concreto, o dispositivo é autoclavado e tratado quimicamente. Sua densidade é menor do que a da água, o que o faz flutuar.
 
Como funciona
A ideia do grupo de pesquisa, do qual fazem parte outros oito estudiosos, entre alunos, professores, doutores e pós-doutores, era criar um mecanismo que não deixasse a larva eclodir ou que não permitisse que as já formadas se desenvolvessem, eliminando-as por asfixia ou por falta de alimento. De acordo com Belchior, para irromper, a larva precisa de um local propício, com água limpa, material
orgânico e oxigênio. E o que esse tijolo faz é não proporcionar esse local para as larvas. Conforme detalha o professor Luiz Carlos Alves de Oliveira, que integra a equipe, depois de receber tratamento químico, o tijolo, cortado em tabletes medindo em torno de 2 centímetros cúbicos, reage na superfície da água através de um processo fotocatalítico – que necessita de radiação solar. Quando se combinam
água, luz e tijolo, um produto – cuja patente ainda está sob sigilo – é liberado, matando as larvas. “Esse produto funciona como um ácido que atinge nossa pele, corroendo-a”, exemplifica Belchior.
 
Os pesquisadores ressaltam que, sem água ou luz, o dispositivo não entra em
atividade, pois é necessário haver a união das duas condições para desencadear a ação. Segundo eles, a tecnologia pode ser aplicada onde houver acúmulo de água. Entretanto, o formato do tijolo poderia não se adequar a alguns locais, como calhas, por exemplo.
 
Manta flexível
Pensando nisso, em um segundo momento do processo de desenvolvimento da tecnologia, os pesquisadores criaram uma manta flexível, de tecido sintético, com as mesmas propriedades químicas do dispositivo e de fácil adaptação a determinadas estruturas, já que ela adere à superfície em que é colocada, assumindo novo formato.
 
Jadson Belchior afirma que tanto o tijolo quanto a manta possuem vida útil média de quase cinco meses - em estudos de bancada (laboratório). Quando está inerte, seja por falta de água, seja por falta de luz, o material não perde as características. “Havendo água e luz continuamente, o tempo de duração é de cerca de cinco meses. Se, por exemplo, houver um intervalo de dois meses na atividade,
a durabilidade subirá para seis meses”, complementa. Sobre a concentração, o professor diz que, em uma caixa d’água de
500 litros, é importante que a superfície seja coberta pelo material, ou seja, deverão ser usados em torno de 200 tabletes.
 
Os cientistas salientam que o princípio ativo utilizado não é nocivo à saúde humana nem afeta a potabilidade da água. No entanto, a tecnologia ainda depende de aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
 
Tecnologia acessível
Todos esses estudos acerca do tijolo só têm sido possíveis porque a empresa mineira Vértica Serviços e Tecnologia Eireli, desde o início, há dois anos, vem financiando a pesquisa encabeçada por Belchior, fazendo aportes semestrais. “Felizmente, fizemos essa parceria com a Vértica porque, se dependêssemos de apoio dos governos federal, estadual e municipal, não teríamos avançado nada. “Não há um mínimo de interesse por ao menos conhecer iniciativas como essa, que pode, dentro de pouco tempo, ajudar a reduzir as filas de pessoas nos postos de saúde em todo o país”, desabafa.
 
Atualmente, segundo conta o sócio-proprietário da Vértica, Joaquim Antônio Gonçalves, que é biólogo, equipes da empresa trabalham num plano de negócios para analisar a valoração do produto, a fim de que ele seja comercializado em breve. “Estamos quase em
fase final – e bastante promissora – de viabilização desse dispositivo que, certamente, será vendido a um preço bastante acessível”, diz.
Professor Oliveira explica que “as matérias- -primas são encontradas em abundância na natureza, e o suporte também é de baixo custo”.
“Além disso, a fabricação é simples. Todo o processo gasta dois dias, mas vislumbramos a possibilidade de que esse tempo possa ser
reduzido ainda mais”, acrescenta Belchior.
 
Gonçalves relata que apostou no invento do grupo de químicos quando ainda existiam poucas evidências de que o produto seria viável.
“Pelo fato de a dengue ser um problema de saúde pública muito grave, que demanda algum tipo de solução urgente, e por eu ter bastante interesse por inovação, topei na hora em que me apresentaram os estudos preliminares”. Caso o produto seja aprovado pela Anvisa, a estimativa de Gonçalves é que, num prazo de 90 dias, os tijolos antidengue já possam ser vendidos.
 
As amostras de ovos do Aedes aegypti usadas nos testes são fornecidas pela Secretaria Municipal de Saúde.
 

 




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