Futebol para mulher, sim!
Não há dúvidas de que o futebol é uma paixão entre os brasileiros. Do que nem todos sabem é que as mulheres estão se tornando, cada vez mais, a bola da vez nesse esporte.
Iêva Tatiana
Partidas informais – as famosas “peladas” – e profissionais já são consideradas lances importantes do cotidiano de muitas jogadoras. Em campo ou no salão, elas estão mostrando a que vieram e, agora que chegaram, não querem saber de ir para o vestiário mais cedo. Entre os principais benefícios da prática, o relaxamento da mente e as melhorias no condicionamento físico são apontados por unanimidade. Já a famosa resenha pós-jogo aparece como uma espécie de prorrogação dessa sensação de bem-estar.
No Teuto Esporte Clube, em Betim, o futebol society feminino virou opção de lazer em família. E a fome de bola foi tanta que a administração abriu as portas para que times de fora participem do campeonato realizado semestralmente no local.
No dia 26 de junho, o time da auxiliar administrativa Rosana Santos Oliveira, de 46 anos, enfrentou a equipe da filha única dela, a estudante de fisioterapia Thaís Oliveira, de 21. “Eu sou uma pessoa que disputa muito as coisas. Não dou espaço, mesmo o oponente sendo minha filha. Gosto de ganhar. Por isso, defendi minha área o máximo que pude. Mas, no fim, ver que ela ganhou me deixou feliz também”, conta a mamãe zagueira, que acabou perdendo a “partida super-equilibrada” por 1 a 0.
O fascínio pelo esporte foi herdado por Thaís, que joga desde os 4 anos – inclusive com os pais, nos momentos de lazer. Embora não tenha se profissionalizado dentro de campo ou do salão, é nessa área que ela pretende seguir carreira. “Eu fazia balé na escola, mas fugia das aulas para jogar bola, e minha mãe acabou aceitando a mudança. Não consigo mais me imaginar sem o futebol”, revela a estudante, que chega a praticar até cinco vezes por semana.
COM FORÇA TOTAL
O aumento do número de mulheres trocando o salto alto pelas chuteiras vem sendo notado pela professora da escolinha do Teuto, Fernanda Oliveira, de 30 anos. Durante seis anos, ela atuou como profissional e, hoje, dá aulas no clube e na Prefeitura de Betim. “Tem crescido também a quantidade de mulheres mais velhas jogando. Muitas não procuram competir, mas praticar uma atividade física e emagrecer. Várias delas têm mais de 40 anos. Percebo nas alunas, e elas também falam isso, uma grande melhora na autoestima, no preparo físico e na socialização”, diz Fernanda.
A jornalista e secretária de Governo de Betim, Zizi Soares, de 40 anos, é um exemplo disso. Insatisfeita com a balança, embora já se exercitasse na academia, ela resolveu, na brincadeira, bater uma bolinha e acabou tomando gosto pela coisa. Zizi confessa que, no começo, atrapalhou-se e ficou perdida em campo. Hoje, não abre mão de vestir o uniforme e ainda faz propaganda na tentativa de escalar mais jogadoras. “Já convenci outras mulheres a jogarem. O futebol faz parte da minha vida, e eu até parei de brigar com meu marido por causa das ‘peladas’ dele. Agora, quem sai para jogar sou eu”, diverte-se.
PROFISSIONAIS
O presidente da Federação Mineira de Futsal (FMFS), José Raimundo de Carvalho, confirma o avanço das mulheres no esporte. Segundo ele, o futsal feminino tem crescido não apenas em Minas Gerais, mas em todo o território nacional, apesar de ainda receber pouco apoio de patrocinadores.
Atualmente, as competições promovidas pela FMFS são disputadas por 13 equipes mineiras: Associação Esportiva Cultura e Social (Belo Horizonte), Sociedade Recreativa Filadélfia (Governador Valadares), Montes Claros Tênis Clube (Montes Claros), Instituto Esporte, Arte e Cultura Primeiros Passos (Passos), Associação Esportiva e Recreativa Usipa (Ipatinga), Sociedade Esportiva Amigos (Teófilo Otoni) e as prefeituras de Nova Lima, Diamantina, Itabira, Congonhas, Luz, Lavras e São Lourenço.
Já a Federação Mineira de Futebol (FMF) conta com oito times na categoria feminina: América, Bola de Fogo, Internacional FF, Manchester FC, Nacional FC e Prointer FC, de Belo Horizonte; Ipatinga FC (Ipatinga) e Real EC (Caeté).
A educadora física e assistente técnica Aline Guedes, 26, tem contrato assinado com o América Futebol Clube, da capital mineira. O amor pela bola fez com que ela ultrapassasse a brincadeira e transformasse o esporte em profissão. Desde os 9 anos, Aline participa de torneios escolares, campeonatos estaduais, brasileiros e até da América do Sul. Nesse período, colecionou várias conquistas, inclusive individuais, como artilheira, melhor jogadora e destaque do campeonato. Entre as competições mais marcantes, ela destaca o Sul-Americano de Futebol de Salão, disputado, no ano passado, pela seleção brasileira na Colômbia. A equipe ficou em quinto lugar. “E o (Campeonato) Brasileiro de Futsal, pelo BJOBJO/Puella, em 2015, em Conselheiro Lafaiete, do qual fomos campeãs, e eu, novamente, artilheira da competição”, acrescenta, orgulhosa.
Esporte para mulher
Mas, apesar do crescimento da participação delas no esporte, um adversário antigo teima em empatar a vida do futebol feminino: o preconceito. Culturalmente conhecida como “coisa de homem”, a modalidade ainda enfrenta resistência. A boa notícia é que ela é tirada de letra pelas jogadoras. A técnica industrial Caroline Marzano Reis Corrêa, de 24 anos, interessou-se pela bola por volta dos 5 anos, ao ver, pela janela de casa, meninos jogando. A devoção foi tanta que ela chegou a ser convidada a jogar pelo Atlético-MG e pelo Santos (SP). Ainda assim, teve de escutar comentários machistas, que foram facilmente jogados para escanteio. “Já fui chamada inúmeras vezes de ‘Maria-homem’. Diziam que futebol era esporte de homens, mas nada disso fez com que eu desistisse da minha maior paixão: jogar futebol”.
A advogada Laura Pinho, 29, também enfrentou situações parecidas com as de Caroline. Adepta do esporte pelo prazer que ele proporciona, ela já precisou lidar, fora de campo, com a “cara de surpresa de alguns”. “O homem, quando discute com uma mulher sobre futebol, sempre solta algo do tipo: ‘Ah, vai para a cozinha, seu lugar é lá. Mulher não entende nada dessas coisas’. Parece que é ofensa uma mulher saber tanto ou mais que um homem sobre o assunto”, afirma Laura. Entretanto, como boa jogadora que é e apaixonada pelo esporte, ela tem um contra-ataque imbatível. “A ideia é abstrair, vestir o uniforme e se divertir, seja jogando, seja torcendo”, finaliza a advogada.
Outra adepta do esporte é a advogada Laura Pinho, 29, que lamenta o preconceito que ainda existe em relação à prática do futebol por mulheres. “Parece que é ofensa uma mulher saber tanto ou mais que um homem sobre o assunto”, afirma.
A secretária de Governo de Betim, Zizi Soares, na brincadeira, resolveu bater uma bola e acabou tomando gosto pela coisa. “O futebol, agora, faz parte da minha vida, e eu até parei de brigar com meu marido por causa das ‘peladas’ dele. Agora, quem sai para jogar sou eu”, brinca.