No palco livre da música
Projeto itinerante revela talentos e abre espaço para artistas em Betim
“Todo artista tem de ir aonde o povo está”. Em Betim, a premissa imortalizada pelo músico Milton Nascimento na canção “Nos bailes da vida” é colocada em prática desde o fim de março de 2010, quando foi criado o projeto itinerante Palco Livre. A iniciativa, lançada pelo produtor cultural e percuterista (mistura de bateria e percussão) Gerald Silva, promove apresentações musicais pela cidade, principalmente em bares e em restaurantes.
A ideia foi inspirada em uma proposta semelhante do também músico Fernando Barbosa, que lançou, na capital mineira, o projeto “Encontro de Músicos de BH”, a fim de “criar um clima artístico diferente” na noite belo-horizontina por meio da variedade de exibições de profissionais e de calouro, segundo definição do próprio “maestro” do projeto.
No caso de Silva, a frustração com a falta de incentivo do poder público à arte e à cultura locais foi a motivação principal para oferecer oportunidades a artistas experientes e novatos que despontam no cenário betinense e não têm recursos para se apresentar. “Meu desejo não se baseou só em músicos, e, sim, em toda a classe artística que existe em abundância em Betim”, revela o produtor.
De acordo com ele, o Palco Livre não conta com fins lucrativos nem políticos, mas exige o cumprimento de algumas regras básicas. Os músicos participantes se apresentam, espontaneamente, durante um tempo pré-acordado, e as participações especiais de convidados podem ter, no máximo, dez músicas ou durar 40 minutos, por exemplo.
O preceito máximo é oferecer tratamento igual a todos, “desde a música caipira ao jazz”, conforme salienta Silva. “A presença de outros segmentos artísticos, como artistas plásticos, atores, escritores, dançarinos, desenhistas e todos os demais, é muito bem-recebida pela classe, o que contribui ainda mais para o sucesso do evento”, destaca.
Ritmo certo
Seis anos e meio depois do lançamento da iniciativa, o percuterista ainda se lembra da primeira edição, no extinto barzinho Tradicional, que funcionava na praça Milton Campos, na região Central de Betim. De acordo com ele, a ideia foi muito bem-aceita e aprovada pela classe artística. “Tanto que existe até hoje”, arremata ele.
A afinidade de Silva com a música começou cedo, no antigo Colégio Comercial, durante as aulas de educação artística com o professor Clóvis Aguiar, filho de Manoel Aguiar. “Um grande músico betinense do qual até hoje sou ‘fã de carteirinha’”, recorda-se.
Os acordes seguintes vieram com a fanfarra do Colégio Comercial, a Escola de Samba Sete de Setembro, a Banda Musical Nossa Senhora do Carmo (orquestra jovem) e diversas outras. Mais tarde, Gerald Silva começou a trabalhar também como produtor cultural.
Durante cerca de 15 anos, no entanto, ele fez uma pausa na carreira por causa da desvalorização sofrida pelos músicos e do não reconhecimento da profissão. “Mas a veia artística falou mais alto, e, há sete anos, voltei com tudo, com produções, gravações em home studio, shows e, claro, o Palco Livre”, destaca.
Atualmente, o evento itinerante é uma das maiores fontes de parcerias musicais na vida de Silva e na de outros músicos, que, a partir dele, formaram bandas, duos e trios. Alguns artistas revelados no projeto tornaram-se respeitados depois das apresentações promovidas pelo produtor cultural e acabaram caindo no gosto do público e entrando em sintonia com a classe artística do município.
Hoje, a agenda de shows contempla, sobretudo, os dias de menor movimento nos estabelecimentos que recebem o projeto, como segundas, terças e quartas-feiras, coincidindo com a folga dos artistas de outros compromissos profissionais. Ainda assim, de acordo com Silva, em várias apresentações o Palco Livre tem casa cheia. “Agora, mesmo com a crise, o público tem respondido muito bem aos convites, e as pessoas chegam dispostas a curtir arte de qualidade”.
Interação
Uma das edições do Palco Livre contou com a participação de Gleyson Fonseca, vocalista da banda Carne Nua. Embora não seja de Betim, mas de Belo Horizonte, ele foi “cobrado” por Silva – antigo conhecido – a se apresentar no projeto. “Como moro em BH, ficava meio complicado pelo fato de (o evento) acontecer nas terças-feiras, mas um belo dia rolou de eu participar”, conta.
Apesar de não se recordar com precisão quando foi a apresentação (segundo ele, há muito tempo), Fonseca não se esquece da presença maciça de músicos. “Esse tipo de iniciativa é muito importante para que haja uma maior interação. Pude rever brothers antigos, bem como fazer novas amizades e novos contatos. O famoso ‘trocar figurinhas’ funciona muito nessas horas”, garante o músico.