O POVO E A ECONOMIA DE MERCADO
POR DOMINGOS DE SOUZA NOGUEIRA NETO
Reza a lenda que “todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido”, mas será mesmo? Será que as pessoas comuns, que vivem do suor do trabalho, sentem-se representadas por deputados, senadores, vereadores, prefeitos, presidentes etc.?
Quando um juiz, um membro do Ministério Público ou um agente da autoridade policial atuam, será que têm em mente aquele trabalhador comum, o servidor público, o aposentado, os grandes contingentes populacionais? Ou pensam antes nas grandes corporações econômicas, nos interesses maiores e abstratos do Estado, ou mesmo no poder, que se alimenta da proximidade com o poder maior?
Ora, mas nós votamos! Existe algo mais democrático que isso? E, se elegemos mal, a culpa é nossa ou, como diria o ditado, “porque ninguém tem estrela na testa”.
Ocorre que vivemos em uma economia de mercado, que é um sistema econômico cujos agentes econômicos (empresas, bancos, prestadoras de serviços etc.) podem atuar com pouca interferência governamental. É um sistema típico da economia capitalista.
A economia de mercado compra e vende de tudo. Defende o Estado mínimo, mas, como em toda mercancia, reivindica subsídios do Estado sempre que é possível. Esse sistema vive da crença sempre realimentada de que tudo está à venda. Não é de forma nenhuma estranho que as pessoas sejam compradas, e o que vemos em toda parte é isto: “representantes do poder do povo” sendo comprados.
Na economia de mercado, o valor do indivíduo é medido por seu sucesso econômico, pelas roupas que usa, pelo carro, pelo perfume, pela casa e pelas “pessoas que tem”. E o povo, que não conseguiu galgar em altura suficiente os degraus da “escada social”, acaba sendo visto como a propriedade das empresas ou do Estado. Não nos esqueçamos de que a palavra “servidor”, usada para os servidores públicos, é apenas um derivativo de “servidão”.
Mas como convencer o “povo” a legitimar as elites que assumem o poder? Isso parece bem simples. Não existe nada pior para a autoestima do que o fracasso econômico, e as pessoas nessas condições tendem a apoiar os que venceram, não os que fracassaram como elas. É por isso que se diz que “os ricos ficam cada vez mais ricos, e os pobres, cada vez mais pobres”.
Os agentes econômicos têm uma formidável porta-voz nas economias de mercado, a imprensa, ou a “imprensa livre”, poderosa formadora de convicções e divulgadora de propaganda. Propaganda de bens, produtos, ideias e ideologias. É uma imprensa dependente do público consumidor, ansioso por conhecimentos que alimentem seu êxito cultural, e da propaganda, que divulga os bens e os serviços que devem ser consumidos por pessoas de bom gosto.
O sistema é complexo, livre em seu contexto, mas não em seu fluxo inexorável. Todavia, nestas linhas rápidas, o que quero dizer é que “todo o poder emana do mercado e em seu nome é exercido”. O resto é platônico.