Por quem os sinos dobram?

POR Domingos de Souza Nogueira Neto*

0
Criado em 15 de Dezembro de 2014 Cultura

Imagem do Nascimento de Cristo

A- A A+

SOMOS UM PAÍS DE GRANDE hegemonia cristã e onde, conforme os dados do últi­mo Censo, divulgado em 2010 pelo IBGE, os católicos são maioria. O Natal, em nos­sa cultura, comemora o nascimento de Jesus Cristo, que veio ao mundo para nos salvar e teria nascido no dia 25 de dezem­bro do ano zero.

Porém, muitos não sabem que o Natal foi originalmente destinado a celebrar o nascimento anual do Deus Sol no sols­tício de inverno (natalis invicti solis), e adaptado pela Igreja Católica, no terceiro século depois do nascimento de Cristo, para permitir a conversão dos povos pa­gãos sob o domínio do Império Romano, passando a comemorar o nascimento de Jesus de Nazaré. Poucos sabem também que o Papai Noel é uma evolução do cul­to a São Nicolau, velho costume dos ho­landeses, que foi trazido às Américas por imigrantes. Chamado de Sinter Klaas na Europa, ele foi rebatizado de Santa Claus nos Estados Unidos.

Embora seja uma comemoração da religião cristã, o Natal é subdividido em diversas “visões” da Bíblia. Algumas a festejam como os católicos, outras religi­ões questionam a data do nascimento de Cristo, baseados na Bíblia e no histórico religioso e, por isso, não comemoram a data no mesmo período que os católicos. É o caso das testemunhas de Jeová, por exemplo. Já a Assembleia de Deus e a Presbiteriana comemoram o Natal com o simbolismo da presença de Cristo entre os homens, cuja finalidade é levar a uma instância reflexiva a respeito de Cristo. “Festejar condignamente o Natal é uma bênção e inspiração para todos quantos nasceram do Espírito ao tornarem-se fi­lhos de Deus pela fé em Cristo”, segundo os evangélicos.

Os judeus não creem que Jesus é o Messias, por isso, não celebram o Natal como o nascimento de Jesus. Mas eles co­memoram uma celebração chamada Ha­nuká. Trata-se da reconquista do Templo judaico que estava em poder dos gregos, em que destruíram todas as simbologias gregas que estavam nesse templo e volta­ram às atividades judaicas. A festa dos ju­deus tem início todo dia 25 do mês judeu chamado Kislev; esse dia corresponde ao dia 22 dezembro do calendário cristão.

“Os muçulmanos não comemoram o Natal, mas reconhecem a existência de Jesus Cristo”, afirma Jasser Hussein, segui­dor da religião, nascido na Palestina e que, atualmente, reside em São Carlos. Segun­do Jasser, uma data muito importante para eles é a Páscoa ou Eid, como é chamada pelos muçulmanos. Durante 30 dias é feito jejum do nascer ao pôr do sol e, no 31º dia, é realizada uma grande festa. A religião islâ­mica tem duas festas que recebem o nome de Eids. A primeira é a Eid-ul-Fitr, que ce­lebra a existência ou a chegada do Corão (a bíblia islâmica). A segunda festa islâmica é o Eid-ul-Adha, a festa do sacrifício. Es­sas comemorações, para os muçulmanos, são como a festa de Natal para os cristãos. Nelas, eles dão presentes, mas não com o mesmo significado dos cristãos. Segundo Maomé, ao presentear uma pessoa, “leva­-se a maldade embora”; é para isso que eles trocam presentes.

O “Diwalli” é um festival hindu de cinco dias que tem o mesmo significado do Natal para os cristãos. Sendo uma das festas mais importantes para essa religião, é uma época em que todos os hindus se juntam à família, que também se denomi­na “Festa das Luzes”, já que todas as casas são iluminadas, simbolizando o conheci­mento. Nessa ocasião, celebra-se a vitória do Bem sobre o Mal, a união das famílias e a esperança no futuro. Nesses cinco dias de celebração, o primeiro é dedicado à ri­queza de espírito. No segundo, é homena­geada “Kalli”, a deusa da força. O terceiro dia é o “Diwalli” (festa religiosa conhecida como o festival das luzes) e o quarto dia é a chegada do novo ano. Por fim, o quinto dia tem por objetivo ver o Bem em cada pessoa. A religião hindu rege-se pelo ca­lendário lunar. Logo, essa época festiva nem sempre é celebrada no mesmo dia no decorrer dos anos.

Como sabemos, budistas são os se­guidores de Buda, mas nem todos sa­bem quem é Buda. O nome real dele é Siddhartha Guatama. Ele era filho de um indiano que viveu há 2.500 anos. Ao atin­gir a “iluminação”, foi consagrado Buda. Então, os budistas celebram o nascimento de Siddhartha Guatama (Buda). Essa ce­lebração budista é realizada no dia 8 de abril e chama-se Hana Matsuri.Já os espíritas, seguidores da doutrina de Allan Kardec, comemoram o Natal da mesma maneira que os católicos. Ocorre uma reunião familiar, onde todos trocam presentes e relembram o nascimento de Jesus. A doutrina kardecista segue o Evan­gelho cristão. “Jesus Cristo foi o maior espírito, o mais iluminado e o mais evo­luído que veio para a Terra. Ele veio até nós para nos mostrar o caminho de luz, o Evangelho e despertar todos os corações para o amor universal e para a bênção da caridade”, afirma Leontina Rodrigues, que há cerca de 30 anos segue a doutrina.

Yemanjá, Yansã e Oxum são entidades comemoradas ao longo do ano nas reli­giões afro-brasileiras, que têm no mês de dezembro um simbolismo todo especial. Mas, para os umbandistas, a comemora­ção do Natal cristão é algo mais natural, porque a maioria dos seus seguidores e médiuns praticantes veio da religião cris­tã. A umbanda encontrou um lugar para Cristo no rol de suas divindades: ele é associado a Oxalá, considerado o maior orixá de todos. No dia 25 de dezembro, os umbandistas agradecem à entidade que, segundo a sua crença, comanda todas as forças da natureza. Já alguns terreiros de candomblé também oferecem algum ritu­al especial à data, mas a prática não confi­gura uma passagem obrigatória em todos os centros.

Já o taoísmo, religião majoritária na China, não tem qualquer celebração no Natal. No entanto, a religião tem inúmeras datas em que se comemora o nascimen­to de grandes mestres ou sua ascensão. O Ano Novo Chinês, assim como no bu­dismo, é a data mais comemorada para os taoístas. Nesse dia se celebra o Senhor do Princípio Inicial.

Um trecho de poema de John Donne, da obra “Poems on Several Occasions”, que em português chama-se “Meditações” e invoca o absurdo da guerra, principal­mente, a civil travada entre irmãos, diz: “Quando morre um homem, morremos todos, pois somos parte da humanidade”. Esse poema influenciou a obra “Por Quem os Sinos Dobram” (em inglês: “For Whom the Bell Tolls”), que é um romance de 1940 do escritor norte-americano Ernest Hemingway. Mas, neste mundo tão pródi­go em deuses que simbolizam nosso de­sejo de iluminação e bondade, podemos também pensar ao contrário, para refletir “que a cada Natal (comemore o Deus que for), nascemos todos, pois somos todos parte da vontade coletiva de que algo nos torne bons e generosos e de que o mun­do seja um lugar melhor”.

* Crítico de arte, estudioso de direito, filosofia, sociologia, psicanálise e professor de judô 




AVISO: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião de Revista Mais. É vedada a inserção de comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros. Revista Mais poderá retirar, sem prévia notificação, comentários postados que não respeitem os critérios impostos neste aviso ou que estejam fora do tema da matéria comentada.