Separamos. E agora, quem fica com o pet?
Guarda compartilhada
Após a separação, Karoline e o ex-marido Marcos optaram pela guarda compartilhada de João, um bernese de dois anos e meio que ele ganhou quando eles ainda eram casados
O amor acabou, mas e o bichinho de estimação? Dividir a guarda é uma boa opção para ex-casais, enquanto a legislação brasileira se adapta aos novos tempos
Luna Normand
SEPARAÇÕES QUASE SEMPRE são muito dolorosas para o casal. Pior ainda é quando há outros envolvidos, deixando a situação ainda mais complicada – ou não. Imagine se, nesse caso, o terceiro membro da família é um animal de estimação? Com quem deve ficar o bichinho?
Na Câmara dos Deputados, em Brasília, tramita o Projeto de Lei nº 1.058/2011, que pretende regulamentar a guarda dos animais em casos de divórcio, aplicando a eles normas parecidas como aquelas em vigor sobre a divisão dos cuidados com os filhos. Por enquanto, a Justiça se baseia na Lei nº 7.196/2012, que estipula que a guarda é de quem comprovar ser o legítimo proprietário do animal por meio de documento considerado válido, como pedigree, ou demonstrar maior capacidade de cuidado, a chamada guarda unilateral.
Enquanto a legislação brasileira se adapta aos novos tempos, compartilhar a guarda do animal amigavelmente, dividindo o carinho, os cuidados e as brincadeiras, é a solução para quem não quer abrir mão totalmente do “bichinho”. Foi o que fez a advogada Karoline Dionísio, 30, desde que se separou, há quatro meses, optando pela guarda compartilhada de João, um bernese de dois anos e meio de idade. Ela e o ex-marido ganharam o animal de estimação quando ainda eram casados. Com a separação, porém, eles tiveram de decidir sobre o destino de João. “Nem discutimos, porque era óbvio que ele ficaria comigo. O Marcos adora cachorro e eu não posso negar que ele tratava o João igual a um filho, mas ele tinha muita coisa comigo e filho fica é com a mãe”, afirma Karol.
Não foi preciso nem acionar a Justiça. Tudo foi definido na base da conversa, por isso mesmo a guarda compartilhada entre eles não tem regra e os dois são livres para ficar com João quando quiserem. “No início, por causa da separação, o Marcos não tinha muito contato com o João, mas eu sempre disse a ele que animal é como um filho: tem de dar assistência, porque ele sente falta. De dois meses para cá, ele passou a pegar o João quando quer. Assim, quando quer vê-lo, ele me liga e vem”, conta.
O advogado Frederico Zerlottini Isaac, associado do escritório Isaac & Ezequiel Advogados e assessor jurídico da ONG de animais Bem Viver, afirma que tentar conversar e estabelecer normas informalmente é sempre melhor, mais rápido e menos traumático do que judicialmente. “Já existem casos de casais que, assim que adquirem animais, celebram contratos que dizem com quem ficará o bicho em caso de separação. Deve-se ingressar em juízo apenas quando o casal não conseguir entrar em acordo quanto à guarda do animalzinho”, explica.
Antes de se reconciliarem, Jésica e Felipe chegaram a disputar quem ficaria com os bichinhos; ela quis, inclusive, levar a questão à Justiça, mas desistiu porque achou o processo muito burocrático/ Fotos: Hilário José
FALTA INFORMAÇÃO
Apesar de ser cada vez mais comum nos dias atuais, a guarda compartilhada de animais de estimação ainda provoca uma série de dúvidas, e o motivo é a falta de informação. A bacharel em direito Jésica de Almeida, 25, chegou a procurar especialistas em direito animal quando terminou o relacionamento de cinco anos com o bancário Felipe Bretas Lage, 27. O casal ficou seis meses separado e, durante esse tempo, criou-se um impasse para definir quem ficaria com o casal de yorkshires Berilo e Mel, de 4 e 3 anos, respectivamente.
“Começou um disputa para ver quem ficaria com os cachorros. A princípio, nós falamos que um ia ficar com a fêmea e o outro com o macho, mas depois vimos que não dava para separá-los. Nós brigamos demais e até querer levar a questão à Justiça eu quis. Procurei informações para ver como funcionava, mas ficou só no desejo, porque eu vi que era tudo muito burocrático”, revela Jésica, que decidiu sentar com o namorado, que era ex na época, e entrar em um consenso.
Como ela tinha mais tempo livre para ficar com os animais, Felipe resolver ceder. “Eu sabia que com ela os cachorros estariam bem cuidados. Seria até egoísmo da minha parte querer ficar com eles sabendo que eu não poderia dar tanta atenção como ela. Nessas horas, temos de pensar no bem-estar do animal também”, salienta o bancário.
Segundo o advogado Frederico Zerlottini, quando é preciso buscar ajuda judicial, demonstrar condições de cuidar do animal pode ser um diferencial. “Quem cuida alimenta, oferece cuidados médicos, leva para passear, demonstrando, dessa forma, ter mais amor, tempo e/ou até mesmo condições financeiras para ficar com o pet. O magistrado, no momento de proferir a sua decisão, fica atento a todos esses fatores, entre outros, para evitar uma injustiça, que pode ser motivada apenas e tão somente por um pedido egoísta e egocêntrico por parte de um dos divorciandos”, afirma.
CUSTOS
Cabe ao ex-casal decidir pela divisão de custos e até mesmo de tarefas. Jésica e Felipe compartilharam não só a guarda de Beliro e Mel, mas também as despesas. “Já existem pedidos de pensão alimentícia para animais. Entretanto, o entendimento dos juízes têm sido o de que eles não têm direito a pensão alimentícia porque esta só é devida a seres humanos”, explica o advogado.
Apesar do período conturbado, a história do casal teve final feliz: os dois reataram o relacionamento logo depois e estão noivos; já o casal de yorkshires ganhou mais três integrantes – Catarina, Luighi e Murilo.
CUIDADOS DEVEM IR ALÉM DA QUESTÃO FINANCEIRA
Assim como uma separação é conturbada e dolorida para seres humanos, para o animal também pode ser um momento de mudanças e adaptações. Sensíveis às emoções dos donos, cães e gatos, muitas vezes, absorvem a dor relacionada ao término, apresentando mudança de comportamento.
A advogada Karoline Dionísio lembra que o seu cão, o bernese João, ficou muito triste quando se mudou com a sua dona para a casa nova. “Ele é muito dócil, mas ficou nervoso, começou a estranhar as pessoas, latia muito e começou a rosnar, coisa que nunca fez”, lembra.
Professora do curso de veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Adriane Val da Costa afirma que não há estudos que comprovem alteração no comportamento do animal em casos de separação ou guarda compartilhada. “O que nós sabemos é que os seres humanos passam o que sentem para o animal. Por exemplo, pessoas ansiosas afirmam ter animais ansiosos, mas nem sempre isso é uma realidade. Por isso mesmo, em casos de separação, a alteração no comportamento do animal pode ser apenas uma projeção dos pais”, afirma.
DICAS PARA UMA TRANSIÇÃO TRANQUILA
Com a constante mudança de ambiente e de rotina em casos de guarda compartilhada, algumas medidas podem ajudar na adaptação do animal à nova vida:
- Mantenha ou crie uma rotina na vida do animal
- Acorde sempre no mesmo horário
- Passeie e alimente-o no mesmo horário
- Dê sempre carinho e atenção ao animal, buscando equilibrar ou melhorar a energia que está transmitindo para o “bichinho”