Um médico multifacetado
Entrevista - Eduardo Amaral Gomes
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Criado em 18 de Dezembro de 2013
Conversa Refinada
Ele tem 70 anos e, dessa jornada, 45 foram dedicados ao exercício da medicina. Entre consultórios, livros, crônicas e festas, doutor Eduardo Amaral Gomes, primeiro ortopedista que atuou em Betim, vive há 35 anos a paixão pela esposa, dona Ana, e acompanha, com orgulho, o sucesso profissional dos filhos. Hoje, aposentado, ele investe na carreira de empresário, empenha-se em contar causos como cronista, degustar bons vinhos e aproveitar a vida intensamente
Viviane Rocha
REVISTA MAIS - O senhor nasceu em Betim? Conte-nos um pouco da sua história.
EDUARDO AMARAL GOMES - Sim. Nasci na antiga Fazenda das Amoras, propriedade da minha família, que, hoje, é o conjunto Parque das Amoras, no bairro das Amoras. Papai era jornalista e técnico agrícola e, naquela época, veio à cidade para tratar da saúde. Depois, já com 1 ano de idade, nós nos mudamos para Belo Horizonte, onde cresci e estudei. Porém, apesar de minha formação educacional
ter sido na capital, sempre frequentava Betim. Nos fins de semana, sempre vínhamos passear aqui. Ia a festas e a bailes dançantes, como o que acontecia no Clube Industrial. Betim era, para nós, um ponto de lazer. Nunca perdi contato com a cidade, apesar de, na época, não residir aqui. Em 1971, depois de ter feito uma pós-graduação em ortopedia e traumatologia, mudei-me para cá. Desde então, nunca mais sai daqui.
E sua mãe?
Mamãe era doméstica e costureira. Ela era de Betim e papai, de Pedra Azul. Quando papai veio para cá, ele conheceu a mamãe e os dois se casaram.
Tem irmãos?
Sim, dois. O Edilson, que mora em Betim, e a Maria de Fátima, que vive em Canelas, no Rio Grande do Sul. Mas ela tem casa aqui também. Meu irmão é engenheiro agrimensor/topógrafo e, hoje, atua como comerciante. Já minha irmã é advogada, mas não exerce a profissão. As pessoas da sua família exercem profissões muito distintas.
Como surgiu a sua paixão pela medicina?
Desde criança, eu sonhava ser médico. Naquela época, quando estava no antigo curso científico, precisava optar por fazer um curso na área de exatas, de ciências biológicas ou humanas, que englobava direito, letras e outras. Optei pelo de ciências biológicas. Fiz três testes vocacionais e todos me indicaram a medicina, inclusive, a especialidade de ortopedia e traumatologia, em que atuei depois de começar a exercer a profissão.
Então, o senhor nasceu para ser médico?
Foi uma definição natural.
Exerceu a medicina por quanto tempo?
Trabalhei exatos 45 anos ininterruptos. Nunca faltei a um plantão sequer e nunca me ausentei das minhas atividades. Há seis meses me aposentei, mas, durante esse período, sempre tive uma atividade paralela, à qual me dedico hoje.
Qual é essa atividade?
O ramo imobiliário. Tenho uma pequena imobiliária, a Alugar Imóveis, a qual sou proprietário, junto com o meu sócio, meu irmão Edilson. Já temos esse empreendimento há mais de 15 anos.
Voltando à medicina, o que mais o emocionou nesses 45 anos de profissão?
A trajetória foi toda árdua, mas muito gratificante. Tive uma boa formação médica e pude exercer minha profissão em sua plenitude. Isso é muito satisfatório. Tenho em minha memória várias lembranças importantes, principalmente, dos pacientes que recuperei. Sou especialista em cirurgia de mão, e Betim é um município localizado às margens de grandes rodovias. Com isso, sempre aconteceram e acontecem muitos acidentes na região. Nós operávamos as vítimas desses acidentes. Na época, o município não tinha um hospital público, tal como hoje. O Hospital Nossa Senhora do Carmo (atual Hospital Unimed BH) atendia Betim e as cidades do entorno.
O senhor trabalhou apenas no extinto Hospital Nossa Senhora do Carmo?
Não, atuei também em outras instituições. No Hospital Nossa Senhora do Carmo, fui médico ortopedista/traumatologista, bem como na Secretaria de Saúde da Prefeitura de Betim. Mas trabalhei ainda no Hospital Geral Governador Israel Pinheiro, em Belo Horizonte, conhecido como hospital do Ipsemg (Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais).
O senhor também é cronista em um jornal de grande circulação em Betim. Como surgiu a paixão pela escrita?
Sempre gostei de português e tive a leitura como um hobby, portanto, sempre gostei de escrever. Na época da faculdade, circulava um jornal chamado “O Termômetro”, do Diretório Acadêmico Lucas Machado. Era uma publicação dos alunos e eu sempre contribuía com alguns textos e crônicas. Quando vim para Betim, trouxe comigo um amigo de infância, que começou a trabalhar na cidade na área de comunicação: o jornalista Clóvis Fonseca Limongi (conhecido como Closé Limongi). Foi ele quem fundou o “O Tempo Betim”. Lembro que, na época, em um belo dia ele me disse: “você vai escrever para o jornal”. Então, ele me deu um espaço na publicação que, naquele momento, era mensal. Comecei a fornecer meus textos para ele, contando causos de Betim. Parece que os leitores gostaram e, com isso, as coisas foram evoluindo. Posteriormente, Closé vendeu o veículo de comunicação para o Mediolli (empresário Vittorio
Mediolli) e parei de escrever no jornal. Hoje, a atual editora do mesmo veículo, Flávia Jardim, que também é minha amiga e casada com um grande amigo meu, o Paulo Henrique Lossio Barros, convidou-me para ter uma coluna quinzenal permanente no semanário. Resolvi aceitar o desafio.
O senhor está casado com dona Ana Maria há 36 anos e, com ela, tem três filhos: Thaisa, 29, Thomas, 32, e Leísa, 34. Algum deles seguiu a carreira de medicina?
Não. Nunca quis forçá-los a seguirem uma profissão que não gostassem. Nenhum deles optou pela medicina. Na minha opinião, o mais importante para a realização pessoal é a pessoa fazer aquilo que gosta. O dinheiro é uma consequência. É por esse caminho que você chega ao conforto financeiro. Mas sempre fiz questão de que eles fizessem testes vocacionais. O Thomas é administrador de empresas, a Thaisa fez administração pública e trabalha no Estado. Agora, concomitantemente, ela faz um curso de direito na UFMG e pretende ser juíza. Já a Leísa se formou em advocacia, não gostou da área e cursou psicologia. Hoje, ela faz mestrado e, no fim do ano, vai defender sua dissertação.
Como conheceu a sua esposa?
Nós nos conhecemos em uma festa junina em Belo Horizonte. Naquela época, era muito comum na capital esse tipo de evento. Na minha escola, teve uma festa chamada “Forró do Doutor” e, como eu fazia residência no Hospital Felício Rocho, fui com um grupo de amigos conferir. Foi muito animado, bebemos todas. Então, eu chamei a Ana para dançar e estamos dançando até hoje. São 36 anos de casamento. Vivemos muito bem e eu adoro a minha esposa.
Antes de conhecê-la, o senhor era muito namorador?
Sim, sempre tive várias namoradas. Inclusive, fiz um período de quarentena para poder terminar com as outras e ficar somente com ela.
Quais os programas preferidos do casal?
Nós temos um sítio aqui pertinho e adoramos ir para lá. Mas também gostamos de fazer programas de casais, como ir a restaurantes jantar. Como gosto muito de tomar vinho, sempre levo a minha garrafa. Também adoramos viajar e sempre viajamos a dois. Estamos planejando, no ano que vem, ir para a Itália.
Considera-se um homem romântico?
É... ainda abro a porta do carro para ela. Faço tudo que posso para poder agradá-la. Gosto muito da minha esposa, e ela é uma grande companheira. Fazemos tudo juntos, inclusive, na parte financeira. Ela sempre trabalhou e sempre me ajudou demais. Se eu tenho alguma coisa hoje, 90% eu devo a ela. É uma mulher econômica, que planejou a nossa aposentadoria. Para mim, é muito gratificante estar ao lado dela.
Como é a sua rotina de trabalho hoje?
Vou a minha empresa diariamente. Além disso, tenho outra firma, chamada Villa Anna Empreendimentos Imobiliários. Então, todos os dias, trabalho nesses dois empreendimentos imobiliários. Além disso, escrevo para duas publicações jornalísticas da região e pertenço a várias sociedades, como o Rotary Internacional. Inclusive, estou hospedando um jovem alemão na minha casa por um programa de intercâmbio. Faço parte da Sociedade São Vicente de Paula e sou membro de uma Loja Maçônica. Também fundei o Clube da Saúde aqui na cidade.
São muitas atividades, como concilia tudo?
Meu tempo fica todo preenchido. Por incrível que pareça, fiquei mais sem tempo depois que me aposentei da medicina.
Conhecendo tanto Betim, qual o sentimento o senhor nutre pela cidade?
Adoro Betim. Aqui nasci e criei minha família. Quando me formei, tive propostas de atuar em várias cidades, mas não aceitei. Na época, em 1971, fui convidado pelo presidente da Sociedade Hospital Nossa Senhora do Carmo para trabalhar como ortopedista. Ele me deu carta branca para poder fundar o departamento de ortopedia e traumatologia do hospital. E, como queria seguir carreira solo, assim o fiz. Fui o primeiro ortopedista de Betim. Foi muito gratificante e sou muito grato a ele. Em 1969, o Hospital Nossa Senhora do Carmo já havia passado por uma grande reformulação física e administrativa. E, quando vim para cá, a unidade era um dos poucos hospitais que faziam atendimento por especialidades. Tínhamos uma equipe bem formada.
Por que, em 1988, o Hospital Nossa Senhora do Carmo fechou as portas?
Na época, fizemos (os sócios-proprietários da unidade de saúde) um estudo e percebemos que, se o hospital continuasse de portas abertas, nós iríamos falir. A tabela de honorários do INPS era e é extremamente defasada. Tanto que todos os hospitais públicos e privados hoje que atendem pelo SUS estão falidos. O sistema paga aquém do que se gasta e ninguém consegue fazer milagre. Naquela época (1988), chegamos à conclusão de que, se continuássemos a trabalhar dessa forma, não conseguiríamos manter a unidade. Nós avisamos às autoridades que a fecharíamos por falta de suporte financeiro e assim o fizemos. Permanecemos por quase dois anos com as portas fechadas, até arrumarmos outra solução. Mas, antes disso, pagamos funcionários e fornecedores. Felizmente, após algum tempo, conseguimos reabri-lo como uma cooperativa de trabalho médico: a Unimed Betim. Foi um sucesso estrondoso.
Como foi o planejamento para inaugurar esse grande empreendimento?
A reabertura da unidade como Hospital Unimed Betim foi custeada por nós. Como não tínhamos dinheiro em caixa, mais de 50% dos nossos honorários foram cedidos ao hospital. Tínhamos confiança na cooperativa de trabalho médico e tivemos um grande apoio do Sistema Unimed Nacional. Mas foi um processo lento e progressivo. Primeiro, abrimos um pequeno ambulatório, uma pequena sala de cirurgia e de consulta. Aos poucos, fomos ampliando a estrutura. Depois da abertura total do hospital, fizemos uma coisa maravilhosa e estrondosa: reformamos 100% da unidade, com instalações novas e modernas. Daí, implantamos o primeiro CTI de Betim e, pouco a pouco, fizemos uma série de modificações na estrutura original. Com o passar dos anos, a Unimed Betim se tornou um hospital de alta resolutividade. Os pacientes betinenses eram tratados adequadamente dentro da unidade. Não devíamos nada a Belo Horizonte. Assim permanecemos, até 2013. Neste ano, através de um acordo entre a Unimed Betim e a Unimed BH, fizemos a fusão das duas Unimeds. Sentimos que precisávamos crescer, e a Unimed Betim precisava muito de novos investimentos. Não queríamos perder mercado.
Como funciona hoje?
Quem administra o sistema é a Unimed BH. Acredito que foi uma fusão que agradou a todos. Os médicos vão ter melhores condições de trabalho e os antigos proprietários também se beneficiaram, pois receberam o valor do negócio à vista. Com a fusão, os pacientes da Unimed Betim também podem ser atendidos em Belo Horizonte e os pacientes da rede Unimed das cidades vizinhas podem ser atendidos em Betim.
Isso era um sonho do senhor?
Sim. Reerguer o hospital e colocá-lo em funcionamento era um grande sonho. Agora, após a fusão, a Unimed BH vai construir outro grande hospital às margens da avenida Marco Túlio Isaac e uma unidade na praça Milton Campos, que terá um ambulatório enorme. Isso é um progresso para os usuários, para os médicos e para a população em geral.
Algum sonho ainda a ser realizado?
Sim. Estou aposentado de todas as áreas da medicina. Essa fase é como se fosse uma página virada na minha vida. Percorri esse longo caminho com consciência, mas precisava, realmente, parar. Estou bem feliz. Cumpri o meu dever. Hoje, tenho o sonho de desenvolver minha empresa Villa Anna Empreendimentos Imobiliários.
Acredita que sua missão está cumprida?
Sim, mas ainda tenho muitos desejos. Diz o ditado popular que um homem, para ser completo, tem de escrever um livro, ter um filho e plantar uma árvore. Tenho plantado muitas árvores, aliás, esse é um dos meus hoobies. Quanto ao livro, já lancei um (“Só Mesmo em Betim”) e, quanto aos filhos, tenho três. Agora, dentro de dois ou três meses, vou lançar outra publicação de causos da cidade. Por isso digo: realmente, eu me sinto um homem realizado e estou muito satisfeito com minha vida.
Fotos: Deivisson Fernandes