Um salto na carreira
Atleta Lidiane Francielly conquistou classificação inédita para o Estado em torneio nacional, que acontece em agosto. Em novembro, ela disputa outro título, o de Miss Minas Gerais.
Iêva Tatiana
Há quatro anos, ela literalmente corria atrás de uma classificação para o Troféu Brasil Caixa de Atletismo, competição nacional que, neste ano, acontecerá em Bragança Paulista (SP), em agosto. Aos 20 anos, Lidiane Francielly Fernandes Barbosa será a primeira mineira a representar o Estado no torneio. Dona dos recordes estaduais nos 100 m e nos 200 m rasos, ela não esconde a felicidade em fazer parte de um grupo tão seleto. “Meu objetivo é ser finalista da prova e seria muito bom subir ao pódio. Só de estar entre os melhores, competindo com atletas olímpicos, já é a realização de um sonho”, afirma Lidiane.
A modéstia é consequência, em grande parte, de uma lesão sofrida pela atleta no ano passado e que a afastou dos treinos por oito meses. Segundo ela, ficar tanto tempo parada é muito ruim para quem vive na velocidade. Por outro lado, ela acredita que a má fase tenha sido positiva para deixá-la mais forte emocionalmente: “Tenho muita fé em Deus e sei que Ele permitiu que eu passasse por um momento de crise para aprender a usar minha resiliência e tirar proveito da situação de estresse e dar a volta por cima”.
Obstáculos superados
Quem conhece a história de Lidiane sabe bem que superação é uma palavra que a acompanha com bastante frequência. Ela começou no atletismo “magrelinha, sem força”, como ela mesma conta, e foi conquistando cada vez mais espaço no esporte, reduzindo o próprio tempo de 14,7 segundos para a casa dos 11. Hoje, ela está entre os 20 melhores atletas da categoria no Brasil.
E, acredite se quiser, tudo começou por acaso – ou por força do destino. Aos 14 anos, ela precisou abandonar as aulas de balé que fazia desde os 8 por falta de dinheiro. Os pais estavam desempregados e não tinham mais condições de alimentar o sonho da filha de fazer parte da Escola do Teatro Bolshoi, em Joinville (SC).
Na mesma época, porém, um teste despretensioso na escola garantiu à adolescente uma vaga na equipe do Centro de Treinamento Esportivo (CTE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sob o comando do técnico Roberto de Santis, que ainda acompanha Lidiane e a inspira constantemente. “Meu treinador, hoje, é minha maior inspiração. Ele veio da Itália para o Brasil aos 22 anos, deixando a família para trás. Ele é o melhor treinador que existe, e quero ser igual a ele. Pretendo entrar na faculdade neste ano e fazer educação física para ser treinadora ou personal trainer”, adianta a atleta.
Incremento profissional
Apesar de acontecer com fluidez, a transição dos palcos para as pistas não foi fácil. As dificuldades financeiras que afastaram Lidiane do balé também chegaram a ser um problema no atletismo, no começo. Ela e a família moram no bairro São Caetano, na divisa de Contagem com Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte. Já os treinos no CTE acontecem na região da Pampulha, na capital. Depois de ela quase desistir do esporte, em função dos gastos elevados com transporte, a equipe dela conseguiu, enfim, um patrocínio para custear o deslocamento dos atletas.
E é assim, superando desafios, que a jovem vem somando conquistas, sem perder o foco no lado bom das coisas. “Ser bailarina do Bolshoi foi um sonho apagado, mas foi necessário isso acontecer, senão eu não descobriria que poderia ser atleta. Já o atletismo foi o que modelou meu corpo, o que me levou para a moda. Olha só como uma coisa leva à outra”, conclui.
Pois é, a novidade mais recente na vida de Lidiane foi um novo salto na carreira. Desta vez, ele veio acompanhado de trajes de gala, fotos e eventos. Além de ser uma grande promessa como atleta, ela agora é modelo e já foi até eleita Miss Contagem, em 2018. Em novembro próximo, a atleta vai representar o município na disputa pelo título de Miss Minas Gerais.
O convite para o primeiro concurso veio de uma agência de modelos, no ano passado, quando ela se preparava para uma competição esportiva. “Sempre fui atleta. Então, não tinha essa coisa de ser delicada nem bonita. No atletismo, temos que ser bons, não bonitos. Fiquei na dúvida se aceitava, mas acabei sendo convencida a ir. Fui na brincadeira, encarando como um hobby, e acabei ganhando”, relembra.
Desde então, Lidiane teve acesso a um novo universo, com a oportunidade de conhecer grandes nomes da moda, algo inimaginável até então. O lado mais positivo, todavia, foi a alavancada na autoestima. Há dois anos, ela deu início a uma transição capilar e botou o crespo pra jogo, assumindo-se como mulher negra e empoderada.
A mudança interior refletiu no lado de fora, e ela se destoou do modelo de beleza padrão, muitas vezes ainda imposto pela sociedade: o de mulheres brancas, com cabelos lisos e compridos. Aliás, Lidiane é um camaleão nesse quesito. Ela já teve os fios alisados, alongados, com tranças e até raspados. E foi justamente com as madeixas naturais que ela desbancou as outras candidatas ao título de Miss Contagem.
“Quando nos aceitamos, é algo libertador. Foi a melhor coisa que fiz na vida. Hoje, virei influenciadora digital nas redes sociais, e as pessoas que se espelham em mim e na minha história também estão deixando o cabelo natural. É muito satisfatório ser uma boa influência”, avalia a atleta e modelo.
Vida corrida
Embora considere 24 horas pouco tempo para fazer tudo o que precisa em um dia, Lidiane não vê problema em conciliar o atletismo com a moda. Isso porque a prioridade dela está bem definida: o esporte. Mas, para quem está acostumada a acelerar e a se superar sempre, uma pitada a mais de desafio não é problema.
“Acho que todo mundo, quando quer muito uma coisa, dá um jeito de conseguir. Este está sendo um ano para eu focar, é tudo ou nada, e vou dar meu melhor”, finaliza Lidiane, ressaltando que ainda está em busca de patrocínios tanto para as competições como atleta quanto para o concurso de Miss Minas Gerais.